domingo, 16 de dezembro de 2012

Carlos Heitor Cony


Folha de São Paulo
O massacre
RIO DE JANEIRO - Quando a porta do Château de Sully se abriu e o comissário de bordo autorizou a descida dos passageiros, JK viu, ao pé da escada, um oficial da Aeronáutica grudado ao último degrau.
Se fosse simples cautela tomada pelo comando da base do Galeão, que encarregaria um de seus oficiais de assistir ao desembarque, o militar estaria ao lado da escada, e não ali, como a impedir que o passageiro da Air France pisasse o chão do Brasil.
O oficial recuou um passo e continuou a barrar-lhe o caminho.
JK estendeu-lhe a mão, cordialmente, não o conhecia, mas o gesto era comum nele. O militar ignorou a mão estendida: tinha missão a cumprir. Entregou-lhe a intimação firmada pelo coronel Ferdinando de Carvalho, que presidia a um Inquérito Policial Militar sobre as atividades dos comunistas no Brasil. O próprio oficial comunicou-lhe, verbalmente, que o ex-presidente estava intimado a comparecer no dia seguinte ao quartel da Polícia Especial do Exército, na rua Barão de Mesquita.
Tão logo o oficial se afastou, outro militar se aproximou e repetiu a cena, intimando-o para outro IPM, este sobre as atividades do Instituto Superior de Estudos Brasileiros (Iseb). A intimação vinha assinada pelo coronel Joaquim Victorino Portella Ferreira Alves e marcava o primeiro depoimento para aquele mesmo dia, às 14 horas.
Juscelino deu-se por intimado. Comunicou aos oficiais que iria para casa, em Ipanema, mas que estaria presente na hora e local determinados. Ladeado pelos dois militares, ele se afasta do avião e se dirige à alfândega, onde parentes o esperavam, apreensivos. Acompanhando o lance à distância, tiveram a impressão de que JK havia sido preso no momento em que voltava a pisar o chão do Brasil.

    Nenhum comentário:

    Postar um comentário