terça-feira, 11 de dezembro de 2012

Denise Fraga


vida real 
folha de são paulo- denise-fraga@uol.com.br
Dezembrices
Este mês começa acabando, um mês em  ciclone com todos os temas do ano à espera do balanço final
Vinha distraída, voltando do mercado, quando pisei num treco. O porteiro do prédio me fuzilou com o olhar.
Compreendi imediatamente o seu ódio. Eu tinha trucidado duas lampadazinhas do cordão de luzes natalinas que ele estava pendurando na planta -esse insuportável trabalho extra que inventaram para os porteiros desde que a China passou a iluminar nossos dezembros.
Sei bem o que é quebrar uma lampadazinha do meio dessas temerárias correntes de luz. Desde que elas invadiram nosso mercado, não há um ano que eu não passe pelo desespero de enrolá-las.
Depois de tudo pronto, uma lâmpada sempre queima no meio, interrompe a corrente e me deixa na angústia entre começar tudo de novo ou ter metade da árvore apagada.
Pedi muitos perdões ao porteiro, o coitado já tinha metade da palmeira enrolada, e saí dali temendo ter contribuído para o aumento do ódio que aquele homem vai acabar sentindo do Natal.
Suspeitei também ter cometido, de minha parte, um ato falho. Sempre adorei as luzinhas, mas hoje, quando começo a ver a cidade acender, sinto um pouco de agonia. Parece o sinal de largada para a correria. Dezembro é um mês que começa acabando, um mês em ciclone, liquidificador de todos os ingredientes do ano à espera do balanço final. É preciso entregar o que não foi entregue, fazer o que não foi feito, falar o que não foi dito. Nada pode ficar para o ano que vem.
Uma amiga me ligou: "A gente não vai se encontrar até o final do ano?!". Não nos falamos há meses, mas dezembro precisa se encarregar do nosso encontro. E dá-lhe correria pra organizar a agenda, finalizar trabalhos, comprar presentes, organizar a ceia, os e-mails, visitar a família, comprar um biquíni, fazer a mala e tudo o mais que parece que precisa ser feito.
Todo ano prometo que não vou cair na cilada, mas, quando vejo, já estou ticando uma lista de afazeres que passo a carregar no bolso.
É que, no fundo, gosto de rituais, dessa ideia conjunta de finalização e recomeço. Apesar da triste histeria dos shoppings e dos amigos secretos obrigatórios, as celebrações de final de ano ainda têm o estranho poder de renovar esperanças. Acredito em janeiro, me faz crer que farei tudo o que quero fazer. Muita coisa volta a sobrar para dezembro. Mas teimo, confio no janeiro seguinte e sigo em frente. Não tem jeito, me enroscarei de novo nas angustiantes luzinhas do Natal porque acho que elas servem mesmo é para iluminar o Ano Novo.

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