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Conta elétrica
Reduzir custo da energia é importante, mas governo não pode impor perdas econômicas significativas aos atores envolvidos no setor
Como diz a máxima popular, dinheiro não nasce em árvore. Quando o governo federal anuncia o plano de reduzir em 20% a tarifa média de eletricidade cobrada dos consumidores, precisa impor uma perda equivalente a outros atores envolvidos na cadeia energética.Além da própria União, que assumiu uma redução de seus tributos sobre eletricidade, empresas geradoras, companhias transmissoras e governos estaduais foram convidados a pagar a conta.
Brasília oferecia prorrogar licenças de geração e transmissão, as quais estão para vencer ou já expiraram, e indenizar as concessionárias por investimentos mais recentes, que ainda não foram pagos -amortizados, no jargão contábil.
Aos Estados caberia uma perda indireta de receita, pois o ICMS sobre a energia mais barata vai arrecadar menos. Além disso, alguns governos são controladores de estatais de geração, transmissão e distribuição. Tinham de decidir se a adesão ao plano seria benéfica ou prejudicial para essas empresas.
No setor de transmissão não houve recusa. Todas as companhias envolvidas -inclusive as controladas pelos governos mineiro e paranaense- aceitaram a proposta federal.
No campo da geração, no entanto, as estatais de São Paulo (Cesp), Minas (Cemig), Paraná (Copel) e Santa Catarina (Celesc) não endossaram o acordo. Alegaram, com base em sólidos argumentos e números, que a adesão seria letal para seu equilíbrio financeiro.
O que vinha sendo uma negociação técnica das mais espinhosas tornou-se então matéria de politicagem. Num discurso inócuo, a presidente da República acusou os governadores cujas estatais não aderiram a seu plano de "imensa insensibilidade".
Entende-se que o Planalto viva dias de inquietação diante dos resultados frustrantes da economia na primeira metade do mandato de Dilma Rousseff, indicando o fracasso das várias tentativas federais de reanimá-la. Diminuir o custo da energia decerto seria uma medida importante a devolver um pouco da competitividade perdida pelo setor privado brasileiro.
Não se pode fazer isso, todavia, à custa da insolvência das empresas ou do aumento de subsídios e do endividamento dos governos. Seria apenas mudar o problema de lugar, sem resolvê-lo.
Usinas elétricas e companhias transmissoras deveriam compensar uma parte da redução de tarifas com ganhos de produtividade e eficiência. Mas esse é o limite sustentável de sua contribuição.
A outra parte cabe aos governos -federal e estaduais. Trata-se, também, de melhorar sua eficiência. Para cada R$ 1 de tributo abatido da energia, é preciso garantir R$ 1 de corte na despesa pública.
Qualquer plano para baixar as contas de luz que desobedeça tais princípios basilares da responsabilidade fiscal será mero populismo.
Revolução em xeque
Confrontos nas praças, ação do Exército, centralização dos poderes no palácio presidencial. A situação atual no Egito lembra de forma preocupante a época do ex-ditador Hosni Mubarak, derrubado em fevereiro de 2011.Quase dois anos depois, está em frangalhos a revolução egípcia -a mais expressiva da Primavera Árabe, devido à importância do país.
Presidente desde junho, Mohamed Mursi, da Irmandade Muçulmana, ensaiou passos de pragmatismo ao mediar a crise entre Israel e o Hamas, mas logo desperdiçou a boa vontade da comunidade internacional ao conceder, via decreto, superpoderes a si próprio.
Com esse ato, Mursi coloca-se à margem de contestações judiciais. Quebra, portanto, o princípio de freios e contrapesos que deveria nortear a democracia nascente.
Após protestos contra a medida, o presidente egípcio acenou com um recuo parcial. A tentativa de conciliação, porém, não evitou a violência, que ultrapassou os limites da praça Tahrir para chegar ao entorno do palácio presidencial.
Islamitas que apoiam Mursi têm enfrentado opositores do novo presidente, uma coalizão fluida de seculares, liberais, socialistas e arruaceiros ligados ao antigo regime. Desde quarta-feira, o saldo é de sete mortos e mais de 400 feridos.
Como pano de fundo da violência está a nova Constituição do país, gestada por um comitê dominado por islamitas. Aprovado a toque de caixa, o documento será submetido a referendo no dia 15.
Sob muitos aspectos, o texto proposto decepciona. Limitação do número de mandatos presidenciais e proteção contra prisões arbitrárias foram ofuscadas pela assimilação da sharia, a lei islâmica, na Constituição. Faltam garantias para as mulheres, para a liberdade religiosa e para a imprensa.
Berço do nacionalismo árabe secular, sede do principal centro de estudos islâmicos e com uma influente minoria cristã, o Egito vive em estado de permanente tensão. Iniciativas concentradoras de poderes apenas agravam a situação.
O processo de restauração da ordem no país precisa passar pela aceitação dos princípios democráticos -e não recuar à repetição de atitudes despóticas anteriores.
Um fracasso no Egito, país que dita tendências na região, não ficará restrito a seus 80 milhões de habitantes. O que está em jogo é o futuro da Primavera Árabe.
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