HÉLIO SCHWARTSMAN
SÃO PAULO - "Moral Origins", de Christopher Boehm, é um livro importante. Como sugere o título, ele trata do surgimento da moralidade nos humanos, mas, ao contrário de obras congêneres, que têm como matéria-prima um misto de especulações filosóficas, modelos matemáticos, "insights" psicológicos e achados neurocientíficos, o autor, como bom antropólogo que é, busca evidências materiais para oferecer uma explicação histórica.
Recorrendo a observações zoológicas de chimpanzés e a um impressionante catálogo do comportamento de várias tribos de caçadores-coletores, Boehm sustenta que a moral humana começa com o igualitarismo. Enquanto nossos primos são animais fortemente hierárquicos, nós nos notabilizamos por formar alianças para destronar qualquer macho alfa que quisesse virar dono do pedaço. Fazíamos isso para garantir que a carne obtida nas caçadas fosse dividida de forma justa.Esse impulso igualitário disparou várias engrenagens. De um lado, valentões incorrigíveis e psicopatas foram eliminados fisicamente -e seus genes excluídos do pool da humanidade. De outro, indivíduos com pendores dominantes aprenderam a exercer o autocontrole, primeiro passo para desenvolver uma consciência moral. Esse processo de seleção social afetou até nossa biologia. O homem é o único animal que cora, a marca física de uma emoção moral.
Pelo meu relato, essa pode parecer mais uma "just so story", uma assertiva que não tem como ser confirmada nem falseada, ou seja, algo sem valor científico, mas, ao longo das 400 páginas da obra, o autor chega a ser obsessivo ao sustentar cada afirmação com evidências empíricas. É tão detalhista que, em algumas ocasiões, o livro se torna repetitivo.
Mesmo que não compremos pelo valor de face a hipótese de Boehm, o texto traz um conjunto admirável de observações bastante contundentes sobre nossa natureza.
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