Revista Veja - 08/04/2013
A formação de um povo pode ser olhada sob vários aspectos. Aqui eu falo
da formação cultural, informação, crescimento, consciência dos direitos e
deveres de quem vive numa democracia verdadeira, que se interesse por
um povo formado e informado. Aqui entra primariamente a educação, que
venho comentando sem conseguir esgotar, assunto inexaurível na vida
privada de todo cidadão e na existência geral de um povo. É preciso ter
em mente que, para os líderes, sejam quais forem, esse deve ser um
interesse primordial em sua atividade.
A mim me preocupa a
redução do nível de formação e informação que nos oferecem. Escrevi
muito sobre as cotas, com que, em lugar de melhorar a educação pela
base, subindo o nível do precário ensino elementar, se reduz o nível do
ensino superior, para que se adapte aos que lá entram mais por cota do
que por mérito e preparo, em lugar de ser, como deveria, o inverso. Com
isso, nosso ensino superior, já tão carente e ruim, com algumas
gloriosas exceções, piora ainda mais. Vejam-se os dados assustadores de
reprovação, no exame da Ordem dos Advogados do Brasil, de candidatos
saídos dos nossos cursos de direito. Os exames de igual caráter para
egressos de cursos de medicina ainda não apresentam resultado tão
incrivelmente ruim, mas começam a nos deixar alertas pois esses médicos
vão lidar com o nosso corpo, a nossa vida. Estudantes de letras
frequentemente nem sabem ortografia, e mais: não conseguem se expressar
por escrito, não têm pensamento claro e seguro, não foram habituados,
desde cedo, a argumentar, a pensar, a analisar, a discernir, a ler e a
escrever.
Agora, pelo que leio, parece que vão conseguir piorar
ainda mais a situação, pois a meninada só precisa se alfabetizar no fim
do 3º ano da escola elementar. Pergunto: o que estarão fazendo nos
primeiros dois anos de escola? Brincando? Gazeteando? A escola vai
fingir que está ensinando, preparando para a vida e a profissão? E os
pais que se interessam, o que podem esperar de tal ensino? Aos 8 anos,
meninos e meninas já deveriam estar escrevendo direito e lendo bastante —
claro que em escolas públicas de qualquer ponto do país onde os
governos tivessem colocado professores bem pagos, seguros e com boa
autoestima em escolas nas quais cada sala de aula tenha uma prateleira
com livros doados pelos respectivos governos, municipal, estadual ou
federal, interessados na formação do seu povo.
Qualquer coisa
diferente disso é ilusão pura. Não resolve enviar centenas de jovens ao
exterior ou trazer estudantes estrangeiros para cá, se a base primeira
do ensino é ruim como a nossa, pois não adianta um telhado de luxo sobre
paredes rachadas em casas construídas sobre areia movediça. Como não
adianta dar comida a quem precisaria logo a seguir de estudo e trabalho
que proporcionasse crescimento real, projetos e horizontes em lugar da
dependência de meninos que não conseguem largar o peito materno mesmo
passada a idade adequada.
O que vai acontecer? Com certeza vai se
abrir e aprofundar mais o fosso entre alunos saídos de escolas
particulares que ainda consigam manter um nível e objetivo de excelência
e a imensa maioria daqueles saídos de escolas públicas ou mesmo
privadas em que o rebaixamento de nível se instalar. Grandes e pequenas
empresas e indústrias carecem de mão de obra especializada e boa,
milhares de vagas oferecidas não são preenchidas porque não há mão de
obra preparada: imaginem se a alfabetização for concluída no fim do 3o
ano elementar, quando os alunos tiverem já 8 anos. talvez mais, quando e
como serão preparados? Com que idade estarão prontos para um mercado de
trabalho cada vez mais exigente? Ou a exigência também vai cair e
teremos mais edifícios e outras obras mal construídos, serviços deixando
a desejar, nossa excelência cada vez mais reduzida?
Não sei se
somos um povo cordial: receio que sejamos desinteressados, mal
orientados e conformados, achando que é só isso que merecemos. Ou nem
pensando no assunto.
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