Revista Época - 08/04/2013
No final de janeiro, esta revista noticiou que o PSDB tinha começado o
ano de 2013 com uma ideia fixa: "Os tucanos se debruçam sobre três
questões centrais. Qual o melhor candidato, qual o melhor discurso e
como evitar os erros do passado". A reportagem, assinada por Alberto
Bombig e Leopoldo Mateus, identificou um certo "farfalhar de penas no
ninho tucano", realçando aspectos ornitológicos da cena política
brasileira. Estava dada a largada na campanha eleitoral de 2014.
Uma
semana depois, ÉPOCA flagrou o mesmo apressamento, agora em "ninhos"
com "farfalhar de penas", mas no 3º andar do Palácio do Planalto. A
reportagem, outra vez de Bombig e Mateus, mostrou como a presidente da
República, ao convocar uma rede de rádio e televisão para propagandear a
redução na conta de luz de seus eleitores, esquentou o clima eleitoral:
"O tom do discurso de Dilma, dividindo os brasileiros entre "nós" e
"eles" – situação e oposição –, foi considerado um gesto de campanha.
Para seus adversários, havia intenções eleitoreiras até na fantasia –
ops, figurino – que a presidente usava". Sim, ela vestia vermelho.
Candidatíssima. Declaradíssima.
Desde então, a agenda nacional
foi abduzida pelas urnas futuras. Além de Aécio, praticamente definido
como o nome do PSDB (embora José Serra ainda recalcitre, ao melhor
estilo dos que "farfalham penas" sem sair do lugar), há os outros.
Eduardo Campos e Marina Silva já puseram o pé na larga avenida. Ele,
embora pertença ao Partido Socialista, da base aliada do governo Dilma,
já desponta na bolsa de apostas como adversário da presidente candidata.
Quanto a Marina, luta para transformar sua Rede num partido oficial. Se
der certo, disputará.
Com as cartas na mesa, não se fala de
outra coisa. E não se reclama de outra coisa. As eleições de 2014
viraram pauta obrigatória nos noticiários, nos jornais e nas revistas.
Ao mesmo tempo, nos mesmos jornais, revistas e noticiários, as
reclamações são caudalosas. A antecipação do debate eleitoral seria
deletéria, nociva para o funcionamento do governo e para a democracia. É
como se o país inteiro fosse ficar paralisado porque a batalha pelo
voto eclodiu.
Será isso mesmo? Francamente: qual o problema de
pensar desde já nas eleições de 2014? Vamos recolocar a pergunta: qual o
problema de tornar pública uma discussão que ocupa, em tempo integral, a
cabeça – e também as penas, em certas criaturas – de todos os agentes
políticos, sem exceção? Se o cálculo eleitoral preside os movimentos de
ministros, secretários, ascensoristas, motoristas e mandatários, por que
não abrir esse tema para o eleitorado, sem restrições?
Alguns
afirmam que a imprensa não deveria dar tanto destaque para o assunto,
pois ele roubaria a atenção de outros temas essenciais, como o
estrangulamento da infraestrutura dos portos, o caos na saúde pública, a
prova de redação do Enem ou as despesas de Dilma com a hospedagem de
sua comitiva em Roma, local em que a presidente pronunciou sua
declaração histórica: "O papa é argentino, mas Deus é brasileiro".
Seria
um erro, dentro desse cenário, dar cobertura à corrida eleitoral? Se
pensarmos com mais calma, vamos concluir que não. Se os partidos e as
autoridades só pensam nisso, só se guiam por isso, esse "isso" tem de
ser assunto de primeira página. A propósito: pode haver frase mais
eleitoreira do que a consideração presidencial acerca da nacionalidade
divina?
Nesse quadro, falar sobre eleições não é um desvio, mas
um dever da imprensa. São as urnas de 2014 – e, por vezes, as urnas de
2018 e de 2022 – que explicam os atos de governo hoje. São elas que
explicam, desgraçadamente, a escolha de novos ministros. Elas explicam
por que voltam a transitar agora na Esplanada dos Ministérios algumas
das pessoas, físicas e jurídicas, que tinham sido varridas na tal faxina
de uns dois anos atrás. E por que criar novos ministérios? (Aliás,
quantos são mesmo os ministérios hoje no Brasil? 39? 45? 83? De quantos
ministros você, leitor, sabe o nome? Pois um novo ministério foi criado.
Por quê? Para melhorar a eficiência administrativa à máquina do Estado?
Não. Ele foi criado para melhorar as chances da presidente candidata
nas eleições de 2014.)
A imprensa deve sim se ocupar desse jogo.
Se os políticos têm fixação nas urnas, nada melhor que garantir que o
eleitor saiba disso. É bom que o eleitor pense em eleições o tempo todo.
No mínimo, ele votará com mais consciência em 2014.
Eugênio Bucci é jornalista e professor da ESPM e da ECA-USP
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