Pierpaolo Cruz Bottini
TENDÊNCIAS/DEBATES
É preciso endurecer a punição domenor infrator?
NÃO
Uma resposta adequada
A trágica morte de um jovem nesta semana deu ensejo a inúmeras manifestações pelo endurecimento da lei em relação a adolescentes infratores. É compreensível a revolta com a violência e correta a exigência para que autoridades fixem diretrizes de política criminal adequadas para impedir ocorrências similares.
No entanto, não parece que a proposta em discussão seja a mais adequada para a redução da criminalidade. Em primeiro lugar, porque não existem dados que mostrem ser a aplicação da "pena de adultos" útil para reduzir o número de jovens infratores.
Estatísticas do Ministério da Justiça revelam que são cerca de 140 mil os presos de 18 a 24 anos, sendo esta a faixa de idade com maior representação nos presídios brasileiros. Ou seja, a aplicação do direito penal normal não impediu ações violentas por parte desses jovens. Ao contrário, os dados demonstram que a prática de crimes é maior nesta faixa do que entre aqueles que contam com 16 a 18 anos.
Por outro lado, devemos deixar de lado o mito de que as medidas para adolescentes são brandas. Para eles, a lei prevê privação de liberdade por até três anos nos casos mais graves, sem os benefícios da progressão automática de regime existentes para os adultos.
Pode-se achar pouco, mas vale lembrar que, em regra, adultos cumprem três anos de completa segregação somente em casos de condenações à pena igual ou superior a 18 anos.
Em suma, há situações em que as medidas aplicadas aos jovens são até mais duras do que a pena destinada aos maiores de idade. Então, por que não unificar as medidas para adultos e menores infratores, ainda mais diante da constatação de que adolescentes têm plena consciência do significado de seus atos?
A resposta não parece complexa.
É incontestável que jovens de 16 a 18 anos têm capacidade de reconhecer a gravidade de um homicídio ou de um roubo. Mas a questão aqui não é saber se tal capacidade existe ou não, mas identificar qual é a resposta mais adequada que o Estado deve dar aos menores praticantes desses atos.
Será a política mais racional reunir tais adolescentes com os adultos condenados nas mesmas penitenciárias? Será realmente a solução para o fim da criminalidade desses garotos submetê-los ao mesmo sistema fracassado construído para "ressocializar" os maiores de idade, que apresenta índices de reincidência de 70%?
Ou será mais consistente uma reforma séria nas medidas socioeducativas, garantindo-se que o adolescente sofra uma reprimenda pelo ato, mas também que receba uma atenção voltada à sua formação, com cursos de capacitação e uma política de ressocialização específica para alguém em desenvolvimento?
Evidente que o adolescente infrator deve sofrer consequências, e ninguém prega a complacência com seus atos. Mas a solução é organizar a resposta estatal de maneira eficiente, fortalecendo sua capacidade de habilitar o infrator para a vida social, com a internação em unidades menores e próximas à família. Aumentar a dispendiosa e inútil vala comum do presídio para adultos somente jogará mais água no moinho da reincidência e, consequentemente, aumentará a violência a médio prazo.
Enfim, responsabilizar o sistema penal pelos trágicos acontecimentos recentes é politicamente fácil, mas não resolve o problema. Para usar expressão resgatada por Ruy Castro em coluna na Folha (ontem), trata-se de uma falsa boa ideia, de aparência encantadora, mas de efeitos pífios, senão contraproducentes.
ARI FRIEDENBACH
TENDÊNCIAS/DEBATES
É preciso endurecer a punição domenor infrator?
SIM
Até quando o ECA vai proteger os infratores?
A capital paulista hoje é reflexo do que acontece na maioria das cidades do país: o medo tomou conta da população. Em pesquisa divulgada pela Rede Nossa São Paulo em janeiro deste ano, a insegurança foi citada por 91% da população como a principal preocupação.Conheço o problema da violência de perto. Em 2003, perdi uma filha de 16 anos, cruelmente assassinada por um menor com a mesma idade que a dela. O número de crimes cometidos por adolescentes vem crescendo ano a ano. Muito se fala sobre o assunto, mas nada de concreto foi feito.
O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, do PSDB, mostrou indignação com novos casos como a série de assaltos realizada pela gangue de Heliópolis formada por crianças de 9 a 14 anos e o assassinato do jovem Victor Hugo Deppman, no Belenzinho, cometido por um menor reincidente de então 17 anos, 11 meses e 27 dias.
Alckmin anunciou que encaminhará ao Congresso Nacional um projeto de lei que torna o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) mais duro em relação a adolescentes envolvidos em casos de violência grave e reincidência.
Não defendo a redução da maioridade penal. Defendê-la aos 16 anos é caminhar na contramão da maioria das nações. Analisando a legislação penal de 57 países, a pesquisa "Crime Trends", realizada pela Organização das Nações Unidas (ONU), constatou que apenas 17% adotam idade menor a 18 anos como definição legal de adulto.
A Alemanha, que tinha baixado a idade penal, fez retornar a maioridade para 18 anos e criou uma sistemática diferenciada para o tratamento de infratores entre 18 e 21 anos. O Japão, ao se surpreender com um súbito aumento de criminalidade entre seus jovens, ampliou a maioridade penal para 20 anos, por entender que é com educação que se previne a violência.
Há dez anos, desde o assassinato da Liana, venho defendendo que os jovens devem ser responsabilizados e punidos por seus atos. Hoje, segundo estudos psicológicos e discussões comportamentais das quais fiz parte, a conclusão é que crianças de 12 anos são perfeitamente conscientes de suas atitudes e consequências. A lei existe para ser cumprida, e os infratores a partir dessa idade --considerada a mínima passível de internação, segundo o ECA-- devem ser encaminhados à Fundação Casa.
Deveriam ser oferecidas medidas socioeducativas e acompanhamento psicológico, de forma a recuperar o menor. Isso não acontece hoje, e frequentemente os jovens se tornam reincidentes.
A responsabilização após a prática de um crime deve começar pelo exame do jovem por uma junta psiquiátrica. Ela avaliará se ele tem consciência do ato praticado. Se tiver, o juiz, por meio de uma alteração legal e não constitucional, deve ter a possibilidade de emancipar esse menor para que ele seja julgado, iniciando o cumprimento da pena numa unidade prisional da Fundação Casa. Assim que completar a maioridade, deverá passar para o sistema prisional comum.
Não vejo o ECA de forma negativa. Ele veio colocar a criança e o adolescente como preocupação central da sociedade. Orientou a criação de políticas públicas em todas as esferas de governo. E estabeleceu o fim da aplicação de punições para adolescentes, tratados com medidas de proteção em caso de desvio de conduta.
Mas isso foi há 23 anos. Está na hora de uma revisão para atualizar alguns pontos, especialmente no que diz respeito aos crimes graves.
Quanto antes esses adolescentes e crianças entenderem que seus atos são intoleráveis, mais rápido eles poderão deixar o caminho do crime e se reintegrar à sociedade.
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