sábado, 13 de abril de 2013

Caubóis da dignidade - Xico Sá

folha de são paulo

Os homens do Palmeiras podem não conquistar nenhum título neste ano, mas voltaram às pradarias
Amigo torcedor, amigo secador, os destemidos caubóis da Pompeia estão de volta. Depois da queda para a segunda divisão e da emboscada fatal e certeira dos cavaleiros do Mirassol, a incrível conquista da vaga na próxima fase da Libertadores ainda ecoa no vale e nas colinas do Pacaembu afora.
Era difícil saber o que era time e o que era torcida na peleja contra os paraguaios naquela noite. E quando isso acontece, o que é raríssimo na vida e até no Velho Oeste, não precisa ser assim um Barcelona para reconquistar a dignidade. Quando isso acontece, no mundo dos verdes, é uma verdadeira fotossíntese capaz de clorofilar uma multidão de Hulks.
O que aconteceu no Pacaembu só acontece com as bandas de rock nos seus melhores momentos, como diria o palmeirense Lúcio Ribeiro. Seja em Manchester ou no ABC. Seja a maior banda de todos os tempos ou um honesto trio de garagem.
Banda e público nos três acordes. Porque este Palmeiras foi uma banda punk. Nada de sofisticação metida na sonoridade. Fazer o que pode com muita raça. Faça você mesmo. Arroz, feijão e bife. Sem muita invenção. No máximo um ovo por cima.
Pode ser também, velho Moa, simples como um ossobuco tradicional da Lombardia ou um minimalista torresmo à milanesa para adoniranizar a existência em um boteco da Móoca ou do Bixiga.
Os caubóis da Pompeia podem não conquistar título algum neste ano. É do jogo jogado. Começaram a fazer mais do que levantar um caneco. Estão de volta às pradarias e aos desertos dos homens em busca da dignidade. Sem dignidade não se faz nada. Não se engole um minestrone --sempre vai aparecer alguém para encher o saco. Sem dignidade não se forra com aquela toalhinha quadriculada a mesa honesta de um lar doce lar ou de uma cantina.
Sem dignidade não se reconquista o sorriso de uma ragazza, não se joga uma moeda na Fontana de Trevi, não se sabe o que é a bela vida mesmo você sendo o Mastroianni.
Sem dignidade não se pega nem o Penha/Lapa, muito menos o Belenzinho/Parque São Rafael, a linha que mais viajei no atlas, onde a Sapopemba é quase a vida toda, velho Gulliver, todas as viagens na cabeça de um homem que não chega ao seu destino.
O motorista sente o olhar baixo de um passageiro sem dignidade. Queima a parada na caruda. Sem dignidade o mais fervoroso dos católicos vai a Roma e não vê o papa. Sem dignidade, tio Nelson, não se pede uma pinga, não se amarra um cadarço, sem dignidade um homem só se abaixa e fica perto da terra que há de comê-lo com fastio e desgosto.
Tudo que aprendi sobre moral devo aos faroestes, não ao futebol, este pesque-pague de todas as traíras e trairagens. Em algumas partidas, porém, os homens repetem os caubóis, como foi o caso do Palmeiras, o time e a força verde na arquibancada.
@xicosa

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