Cauã Reymond viverá traficante no cinema, vai estrelar séries e quer ter mais filhos
DE SÃO PAULO
De máquina fotográfica em punho, Ana Cunha, 67, conduz os visitantes até a laje de sua residência de quatro andares no Complexo do Alemão, no Rio. "O bom filho a casa torna", diz, ao abraçar Cauã Reymond, 33, o dono do pedaço durante as filmagens do longa "Alemão", com estreia prevista para novembro.
Cauã Reymond vive traficante em filme sobre ocupação do Alemão
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O ator Cauã Reymond, 33, observa o Complexo do Alemão, no Rio, da varanda de uma casa
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"Nossa, você tá magrinho", diz dona Ana, que alugou seu puxadinho, com piscina, churrasqueira e vista do teleférico, para a produção do filme. Derrubado por uma virose, com 38º de febre, ele carrega um kit de sobrevivência para o trabalho: antitérmicos, própolis, termômetro.
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Os domínios de dona Ana viraram o quartel-general do traficante Playboy, o vilão da história. "Estava com saudade de fazer um personagem obscuro, após dois mocinhos na TV. O convite era para ser um dos policiais, mas depois de ler o roteiro pedi para fazer o traficante", conta Cauã à repórter Eliane Trindade.
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O galã da Globo, que emendou dois sucessos na telinha --Jesuíno, de "Cordel Encantado", e Jorginho, de "Avenida Brasil"-- é o protagonista do filme que retrata a ocupação da favela carioca pela polícia em 2010.
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Em sua preparação para o thriller que leva o nome do morro onde o jornalista Tim Lopes, da TV Globo, foi assassinado em 2002, o ator conviveu com moradores, funqueiros e antigos soldados do tráfico. "Fiz contato com gente ligada a diferentes facções." De um deles ouviu um conselho divertido: "Se você for assediado, imagina que é o dono do morro".
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O "dono do Alemão" na ficção se orgulha de ter dado mais musculatura ao traficante que trava uma guerra particular contra cinco policiais infiltrados na favela. "Cauã saiu da zona de conforto. Além de atuar, é produtor associado. Contribuiu com dicas para o roteiro e para o figurino", relata o produtor Rodrigo Teixeira.
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Orçado em R$ 4 milhões, o filme foi produzido e rodado em apenas 127 dias. Cauã emprestou ao personagem também uma camisa do Flamengo, seu time do coração.
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Ouviu muito "proibidão", estilo de funk que retrata a vida bandida. Entoa uma estrofe de "Visão de Cria", do MC Smith: "Nós fecha nessa porra/no claro e no escuro/nós roba/nós trafica/nós não gosta de andar duro". Aparece "trepado de ouro", como diz a música, coberto de correntes e anéis dourados.
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De bermuda e camiseta, é logo reconhecido pelos fãs. "Ai, Jesus, é ele", gritava uma menina ao vê-lo retornar ao Alemão para as fotos desta reportagem. "Está cada vez mais difícil fazer laboratório. Você é observado em vez de observar. Mas eu consegui um equilíbrio."
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Depois de subir o morro, o termômetro também sobe. Bate nos 39º. A jornada de trabalho vai varar a madrugada. É hora de ligar para o médico e fazer um breve repouso em casa, no condomínio onde mora com a mulher, Grazi Massafera, 30, e a filha, Sofia, que completou um ano na última quarta-feira.
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O personagem violento contrasta com o momento de paz e alegria na vida familiar. "Por mais que o filme e o meu papel sejam de um universo tão sombrio e delicado, quando chego em casa me reconecto comigo mesmo só pegando minha filha no colo."
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Sofia já fala "papá", revela o pai de primeira viagem. Ele já planeja aumentar a prole. "Queremos mais filhos. Eu organizo meu dia para ficar mais tempo com ela. Essa fase é uma delícia."
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Juntos há seis anos, Cauã e Grazi nunca atuaram um ao lado do outro. "A gente não aceita muito trabalhar junto. Mas, quando decidimos ter filho, aceitamos alguns trabalhos de publicidade", diz. "Como diz a expressão, todo filho vem com um cofrinho."
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Depois de filmar até as 7h, ele teria pela frente um domingo de trabalho. Ao lado de Grazi, embarcaria para SP para gravar um comercial.
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Cauã chegara à locação do set noturno às 4h. Uma rua foi interditada em Rio das Pedras, favela da Barra da Tijuca, para as filmagens das cenas finais. Ele vai para o quartinho da casa de um morador transformado em camarim. Cumprimenta Caio Blat, que faz um policial e chega coberto de sangue cenográfico.
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Enquanto é maquiado, Cauã tira o termômetro do kit. A febre baixou para 37,2º. A produção evita falar o nome do astro global para não atrair uma multidão de curiosos. "É o Valdemor, o inominável", brinca um produtor.
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Deu certo até ele se posicionar para filmar na rua. São 6h30. "Lindo, eu te amo", grita uma adolescente. "Elas também, mas têm vergonha de dizer", completa, referindo-se às colegas que posicionam os celulares para registrar cada lance. "Ele é tudo, pena que é da Grazi", emenda outra.
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Com 11 anos de profissão, Cauã deixou para trás a imagem do garotão bonito, ex-campeão de jiu-jítsu, que fez sua estreia em "Malhação", depois de uma bem-sucedida carreira de modelo.
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Foi garoto-propaganda da Abercrombie. Na última viagem a Nova York, foi com a mulher à loja da marca na Quinta Avenida. "É hilário ver os vendedores sem camisa." Ele exibiu os músculos na passarela dos 18 aos 20 anos.
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Fez o circuito Paris, Milão, Nova York, até decidir se dedicar a um curso de interpretação com Susan Batson, que foi do famoso Actors Studio. "Eu não tinha dinheiro. Ela me deu uma bolsa de estudo e, para me manter, eu era o faz-tudo da escola. Varria o chão, limpava banheiro."
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O primeiro contrato longo na TV veio depois do sucesso na novela "Belíssima", no papel do michê Mateus, que fica com a vilã Bia Falcão. "O beijo na Fernanda Montenegro me deu moral", brinca, sobre a cena final dos dois. O carimbo de galã já foi superado. "No começo, atrapalhava. Hoje, me ajuda. O fato de ser conhecido atrai público para o cinema."
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Cada vez mais presente na telona (já são 11 longas no currículo), Cauã vai emendar um set no outro. Em maio, começa a rodar "Tim Maia", de Mauro Lima, a cinebiografia do cantor, na qual faz o narrador. Em julho, grava "Amores Roubados", minissérie global de George Moura e José Luiz Villamarim, que será exibida em janeiro. Também será o protagonista da série policial "O Caçador", de Marçal Aquino, Fernando Bonassi e José Alvarenga Jr., prevista para o segundo semestre.
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No fim do ano, embarca para o sertão para ser o protagonista de "Língua Seca", de Homero Olivetto. Viverá o líder messiânico de uma turma de motoqueiros. "É um ano cheio", conclui, em clima de "produção máxima".
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Filho de uma astróloga, Cauã acabou de refazer o mapa astral. "Fiz o primeiro com 28 anos, época do Retorno de Saturno, de muitas mudanças. Agora, de novo. Sinaliza um período de renovação e busca de outras formas de expressão." Para ele, a conjunção astral é a confirmação de que era mesmo hora de se aventurar como produtor nos três projetos cinematográficos nos quais atua neste ano.
Mônica Bergamo, jornalista, assina coluna diária publicada na página 2 da versão impressa de "Ilustrada". Traz informações sobre diversas áreas, entre elas, política, moda e coluna social. Está na Folha desde abril de 1999.
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