terça-feira, 7 de maio de 2013

Suzana Herculano-Houzel

folha de são paulo

O que fazer com sociopatas adolescentes?


Ao completar 18 anos de vida, o jovem brasileiro recebe um presente para o resto da vida: a imputabilidade penal, ao ganhar o status de um adulto plenamente responsável por seus próprios atos e, portanto, a quem pode ser atribuída a culpa por danos causados a outrem, e, com a culpa, suas consequências penais.
É uma idade arbitrária, claro. A adolescência é um processo que se estende por ao menos uma década de vida, durante a qual várias transformações ocorrem no cérebro e fazem com que a criança se torne um adulto capaz de raciocínio lógico e abstrato; capaz de se colocar no lugar dos outros e, assim, viver bem em sociedade; capaz de sentir remorso e, sobretudo, também antecipar possíveis remorsos.
Esta última capacidade é a base do raciocínio consequente, por sua vez base da imputabilidade criminal: a noção de que decisões de todo tipo, das mais prosaicas às mais transformadoras, são tomadas com a plena ciência das suas consequências sobre si mesmo e sobre os outros.
A neurociência, hoje, sabe que o raciocínio consequente depende de regiões do córtex como o órbito-frontal, uma das últimas áreas do cérebro a terminar de amadurecer.
Mas, por ser um processo, e não um evento com data marcada, não há como definir quando exatamente essa capacidade se instala plenamente no cérebro.
Provavelmente é bem antes dos 18 anos --mais cedo em uns, mais tarde em outros. Mas é bastante seguro presumir que, aos 18 anos completos, o cérebro de essencialmente todos os jovens já tenha alcançado a capacidade de compreender e antecipar as consequências dos seus atos.
Reduzir essa idade arbitrária para outra também arbitrária seria aceitar a possibilidade de imputar penas a jovens ainda não de fato prontos para responder por suas ações.
Contudo, se a maioridade penal aos 18 anos protege uns, por outro lado ela deixa a sociedade exposta a uma porção significativa da população que só agora começa a ser reconhecida pelo perigo que ela representa: a dos sociopatas.
Para esses, não há correção conhecida ou possibilidade de recuperação.
Ao contrário da adolescência, que "passa", a sociopatia é desde sempre e para sempre.
Jovens sociopatas de 13 anos, 16 anos, 18 anos incompletos ou 21 anos continuarão sociopatas --e se eles já agem como tais, deveriam ser reconhecidos e tratados como tais.
Voto por manter a maioridade penal aos 18 anos, mas por tratar sociopatas de qualquer idade como sociopatas que são: um perigo para a sociedade.
Suzana Herculano-Houzel
Suzana Herculano-Houzel, carioca, é neurocientista treinada nos Estados Unidos, França e Alemanha, e professora da UFRJ. Escreve às terças, a cada duas semanas, na versão impressa de "Equilíbrio".

Nenhum comentário:

Postar um comentário