terça-feira, 7 de maio de 2013

Gustavo Patu

folha de são paulo

Somos tão velhos
BRASÍLIA - Ainda lembrado como autor de canções políticas, Renato Russo não compôs mais do que peças infantojuvenis para o gênero. Rimava e contrapunha "ninguém respeita a Constituição" com "todos acreditam no futuro da nação". Mas a época ajudava: "Que País é Este?" parecia uma pergunta pertinente na Nova República de José Sarney.
Com o fim da censura e a moda do rock, surgia uma nova safra de letras de protesto, contra a polícia, o serviço militar, o vestibular, a corrupção, o capitalismo selvagem. A velha MPB do hoje governista Chico Buarque, com seus cálices, genis e zepelins, era por demais metafórica para a geração, vá lá, Coca-Cola.
O próprio Russo, embora tenha contribuído decisivamente para o surto de diatribes, não insistiu no filão. Saiu-se melhor cantando angústias cotidianas de jovens adultos.
Se é para fazer rima pobre, não sobrou inspiração para os letristas da redemocratização. Lobão, no Faustão, soava transgressor ao pedir ao vivo votos para Lula na campanha presidencial de 1989. Agora choca ao dizer que Dilma Rousseff foi terrorista e ao recordar as advertências da mãe a respeito dos perigos do comunismo sem família.
"Uma coisa que nunca descobri é por que todo artista, esse tal de Caetano Veloso, por exemplo, tem de ser dessa tal de esquerda", questionava o general e presidente João Figueiredo. Com a tal de esquerda no poder, há mais exceções. Além de Lobão, Roger Moreira, para quem "a gente somos inútil", é opositor ativo de teses petistas e socialistas.
A crítica engajada sempre desprezou as emoções alienadas de Roberto Carlos ("Debaixo dos Caracóis dos Seus Cabelos", composta na ditadura em solidariedade a Caetano no exílio, não bastava). Lembrar de tudo isso torna mais divertido ver "Detalhes" --"son cosas muy grandes para olvidar", na versão em espanhol-- convertida em trilha da propaganda política do chavista Nicolás Maduro.
gustavo.patu@grupofolha.com.br

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