Zero Hora - 02/06/2013
Foi matéria nos jornais: estamos dormindo menos e mal. O celular, sempre
à mão para olhar os e-mails e o Facebook entre uma virada e outra na
cama, é uma das razões para isso. O barulho da rua, coisas por fazer e a
cabeça que não desliga quando a luz apaga, situação típica dos quadros
de estresse, são outros dos motivos. Parece que o brasileiro dorme hoje
uma hora a menos do que há 40 anos.
E que a média nacional é de seis horas e meia por noite, bem
distante das ideais oito horas de descanso das modelos para ter a pele
fresca e a aparência louçã. Os homens são os mais afetados pela falta de
sono. E a falta de sono causa vários tipos de mazelas, como alterações
na memória e no humor, interferências no metabolismo, propensão a
diabetes e impotência. Não se espante, pois, se a sua senhora aparecer
com um chazinho de camomila todas as noites. O seu sono também é do
interesse dela.
Na literatura, a insônia já deu assunto para muita história boa.
Existem insones em obras de Proust, Tchekcov, Borges, Dostoievski e
muitos mais autores que ou não lembro, ou não li. A insônia confere
dignidade a um personagem. Já eu durmo tão fácil que chega a ser
constrangedor. Em situações de tristeza extrema, de pindaíba absoluta,
de solidão completa, de desilusões variadas, de hecatombe no trabalho,
de desavenças familiares, mesmo assim eu durmo.
Pode passar a errônea impressão de que não sei sofrer, mas juro que
sei. A questão é que durmo fácil. Em compensação, a maioria das pessoas
das minhas relações frita na cama todas as noites. Sem remédio, muitas
preferem nem deitar. Conheci um rapaz que não dormia há quatro anos. Era
o que ele dizia. Faz tempo que não o vejo. Espero que tenha conseguido
pregar os olhos ou que, pelo menos, vire personagem de livro. Nem que
seja o Guinness Book.
Para quem não consegue dormir de noite, existe o recurso dos
pequenos sonos reparadores. A sesta na cadeira do escritório ou sob a
mesa de trabalho é um deles. Quando meu filho era bebê, desenvolvi o
método de dormir de pé durante o minuto em que o leite da mamadeira
esquentava no micro-ondas. Era reconfortante e eu até sonhava. O cansaço
de uma mãe recente deveria ser sintetizado por um laboratório e
receitado aos insones.
Derruba qualquer um. Sobre sonos de emergência, li certa vez que,
após algumas horas em uma festa, a atriz Tônia Carrero ia ao banheiro e
tirava uma soneca de 20 minutos. Depois disso, ficava pronta para varar a
madrugada dançando. O único senão é que, se o cochilo passasse dos 20
minutos, a Tônia emendava a noite dormindo. Imagino o susto da moça da
limpeza ao abrir a porta e encontrar uma diva roncando na privada.
Quem também nunca dorme são os adolescentes, não por insônia, mas
porque não concordam que a noite foi feita para descansar. Diferente das
manhãs de aula, o horário preferido deles para dormir. O esforço de uma
mãe para tirar um adolescente da cama deveria ser sintetizado por um
laboratório e receitado aos fracos. Não há nada, mas nada mesmo, que
exija mais força, superação e determinação de alguém.
Elena reconta a história de Elena Andrade, atriz em início de
carreira que se suicidou aos 20 anos, quando sua irmã e diretora do
documentário, a Petra Costa, tinha apenas sete. Aos 29, Petra narra o
filme como se fosse uma carta para a irmã.
Elena deixa uma impressão tão forte que o cineasta Jorge Furtado, em
debate com a Petra e com o escritor Peninha Bueno, perguntou o que a
guria vai fazer agora que já realizou um filmaço como este. O bate-papo
está disponível em podcast na radioeletrica.com. E para ver o trailer e
mais informações. Depois é pensar em Elena até dormindo.
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