Muita pajelança Dilma terá que fazer,
agora que parece ter entendido que as coisas vão mal na coalizão. E pior
ficarão, na medida em que se aprofundarem os conflitos eleitorais
Estado de Minas: 02/06/2013
A presidente Dilma
Rousseff faz amanhã uma pajelança com os cardeais peemedebistas para
discutir os problemas de sua coalizão parlamentar, mas eles não estão
apenas no PMDB. As queixas, o descompromisso crescente, o corpo mole
foram se instalando ao longo dos últimos meses, mas o governo fingiu que
não viu e seguiu acreditando em duas lendas. Uma, a de que a base
governista contava mesmo com 423 deputados. Essa é a soma das bancadas
da coalizão, não a soma dos que estão com o governo para o que der e
vier. Outra, a de que a alta popularidade de Dilma e suas chances de ser
reeleita eram suficientes para manter a vassalagem dos aliados.
Se
a base tivesse mesmo 423 deputados, mesmo na ausência dos 80
peemedebistas, o governo não enfrentaria dificuldades nas votações. Cada
matéria tem sido aprovada a duras penas na Câmara, enfrentando a
obstrução de uma oposição mais saliente e a ausência governista. A
consequência foi a recusa do Senado a aprovar duas MPs. Uma semana
antes, o presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), havia feito uso
de todas as prerrogativas de seu cargo para conseguir aprovar a MP dos
Portos, faltando apenas quatro horas para o final do prazo. Para isso,
comprometeu-se com o plenário a não forçar mais votações a menos de sete
dias da expiração. A situação se repetiu, ele não teve outra saída.
Depois do atrito telefônico com a ministra da Casa Civil, Gleisi
Hoffman, Renan fez um diagnóstico preciso: as pessoas em torno da
presidente precisam compreender melhor o funcionamento das instituições
legislativas.
Muitas coisas o atual inquilinato palaciano parece
não compreender no relacionamento com o Congresso. Demandas surgirão
sempre. Um terço delas são próprias dos governos de coalizão e precisam
ser atendidas. Governo de coalizão é sociedade partidária, todos têm
direito aos dividendos. Outro terço é composto por demandas legítimas
dos partidos ou de setores da sociedade por eles representados. Devem
ser discutidas e negociadas quando não coincidem com a posição do
Planalto. Por fim, um terço é composto por interesses nem sempre
legítimos, apresentados pelos que criam dificuldades para obter
facilidades. Cabe ao governo separar o joio do trigo e negociar o que
pode. Não dá para impor tudo sem nada ceder. Depois, é da cultura
parlamentar a carência por atenção, por gestos de apreço que não custam
nada, apenas um mínimo de afabilidade. Aquilo que Lula tinha de sobra e
alimenta o saudosismo da base.
Outro problema é o canal. O
interlocutor do governo precisa ter autonomia para negociar e poder para
bancar seus acordos. Como Dilma não gosta de compartilhar uma coisa nem
outra, os canais se desgastam. A ministra Ideli Salvatti conhece o
Congresso, seus atores e humores. O que lhe falta é maior delegação.
Fala-se que o ministro Aloizio Mercadante vai ajudar, talvez assumir as
tarefas de articulação política. Ele também conhece a Casa, mas gerindo a
grande máquina do MEC, não terá tempo para um papel que exige muita
conversa.
O governo falha e o Congresso também claudica. Por
exemplo, não aprovando o novo rito para a tramitação de MPs, a chamada
PEC do Sarney, que está parada na Câmara desde o ano passado. Se ela
estivesse em vigor, as comissões mistas estariam obrigadas a emitir
parecer em 10 dias. Por isso, o deputado Garotinho protestou contra a
decisão de Renan: as comissões são compostas por deputados e por
senadores. E têm deixado pouco tempo também para o plenário da Câmara.
Muita
pajelança Dilma terá que fazer, tendo agora entendido que as coisas vão
mal. E pior ficarão, à medida que se aprofundarem os conflitos
eleitorais.
Mensalão: dois pontos
A
decisão do presidente do STF, Joaquim Barbosa, de deixar para o segundo
semestre o julgamento dos embargos declaratórios dos réus do mensalão
levantou um receio no PT: o de que, assim como o julgamento da ação
penal coincidiu com a campanha eleitoral de 2012, a análise dos embargos
vá coincidir com a disputa de 2014.
Esse assunto não acabará tão
cedo. Esgotados os recursos e publicado o acórdão final, os réus
começarão a cumprir penas. Mas, no dia seguinte, os advogados entrarão
com pedidos de “revisão penal”. É nessa fase que os réus esperam
conseguir derrubar o pilar central da acusação, de que houve desvio de
dinheiro público do fundo Visanet e da Câmara dos Deputados, que tinham
contratos com agências de Marcos Valério. Sem a tese do desvio, o
valerioduto seria apenas um caixa dois. O jornalista Raimundo Pereira,
na revista Retrato do Brasil, vem apresentando documentos comprovando a
realização de todos os serviços contratados pelo Fundo Visanet, que é
privado (seus recursos vieram da Visa Internacional) e não público, como
sustentou o STF. Se provado que não houve desvio, cairão as condenações
por peculato, por exemplo.
Fora da foto
A
Comissão de Anistia do Ministério da Justiça tem nos brindado com
excelentes publicações, especialmente no que diz respeito à memória da
ditadura. Mas, no livro que reúne relatos de participantes do movimento
estudantil sob o título 68: a geração que queria mudar o mundo, com
organização de Eliete Ferrer, chama a atenção a ausência dos depoimentos
de José Dirceu e Franklin Martins, pelo papel que tiveram naquelas
jornadas. Em 1968, os estudantes falariam em stalinismo.
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