Tudo ou nada
É uma irresponsabilidade realizar a partida de hoje, entre Brasil e Inglaterra, com enorme público e com o Maracanã inacabado, por causa das obras em volta do estádio. A suspensão e liberação do jogo, pela Justiça, despertou, em todo o mundo, mais temor sobre a organização do Mundial.
Há uns 15 anos, critico a maneira de jogar no Brasil. Não vou repetir os detalhes. O leitor já está cansado de ler. Alguns jornalistas discordam, por terem ótimos conhecimentos técnicos, e outros, porque não entendem do assunto. São os que mais opinam. Isso tem mudado. Recentemente, até a turma do oba-oba aplaudiu as duras críticas do alemão Breitner e de Paulo Autuori.
O brilhante jornalista inglês Tim Vickery, radicado no Brasil há muito tempo, que admira e que tem uma visão ampla, correta e imparcial do futebol brasileiro, disse, no programa Redação SporTV, sem o exibicionismo de Breitner nem a excessiva tolerância e submissão de parte da crônica esportiva, que não entende como o Brasil valoriza hoje muito mais o estilo guerreiro, brigado, do que os conceitos de como se jogar um bom futebol.
As partidas entre Atlético e Tijuana e entre Fluminense e Olímpia mostraram novamente que o futebol sul-americano se aproxima, cada vez mais, do jogo tumultuado, emocionante, do jeito que gosta o torcedor apaixonado, e, cada vez menos, do jogo mais técnico e dos torcedores que querem apreciar, entender, e não apenas torcer. Neste caminho, piora a qualidade de nosso futebol. Evidentemente, há também partidas, no Brasil, que reúnem muita emoção e muito talento, muitas delas em jogos do Galo.
Preciso explicar algo que tenho dito nestes 15 anos. Sempre critiquei a supervalorização dos técnicos brasileiros, porque deram a eles uma excessiva importância nos resultados. Por outro lado, houve, neste tempo, crescimento da importância dos sistemas táticos e, consequentemente, dos treinadores, em todo o mundo. Parece contraditório, mas não é. Nesta evolução tática, os treinadores do Brasil ficaram para trás.
Nosso futebol não evoluiu, ou piorou, mas não está tão ruim. Em casa, se melhorar bastante, passa a ter chances de ganhar a Copa do Mundo. O Brasil não precisa jogar muito para ganhar dos ingleses. A Inglaterra pratica um futebol coletivo melhor que o do Brasil, mas tem um jogo muito linear, previsível. Não tem a impetuosidade dos alemães, a delicadeza, no trato da bola e na troca de passes, dos espanhóis nem um fenômeno, como a Argentina.
Quando o Mundial terminar, dependendo do resultado, da atuação da Seleção e da organização do evento, haverá uma grande depressão ou uma grande euforia. No Brasil, é tudo ou nada. Seja o que for, é necessário haver uma profunda reformulação, a médio prazo, de conceitos e de nomes, dentro e fora do campo.
Tostão, médico e ex-jogador, é um dos heróis da conquista da Copa do Mundo de 1970. Afastou-se dos campos devido ao agravamento de um problema de descolamento da retina. Como comentarista esportivo, colaborou com a TV Bandeirantes e com a ESPN Brasil. Escreve às quartas e domingos na versão impressa de "Esporte".
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