Descriminalização não foi incluída no documento final, que defende foco em prevenção
Apesar de não ter sido incluído o tema da descriminalização das drogas no documento final do encontro, de anteontem, só a decisão de rever a abordagem para o controle ao narcotráfico na região já foi considerada uma vitória pelo organismo.
"Conseguimos mais consenso do que esperávamos", disse o secretário-geral da OEA, José Miguel Insulza, em coletiva de imprensa ao fim do encontro. Segundo ele, a questão da legalização das drogas não está na declaração, mas é algo "que pode mudar".
"Alguns países já legalizaram a maconha, então essa é uma questão passível de discussão", disse. Para o presidente guatemalteco, Otto Pérez, a declaração final do encontro "rompe um tabu".
A maior resistência vinha dos Estados Unidos, que nas últimas décadas pautou a política de combate às drogas no continente. Segundo o secretário de Estado, John Kerry, é hora de "dar boas-vindas a uma discussão saudável".
A principal crítica ao atual modelo é a violência que o combate ao narcotráfico gerou nos últimos anos.
Em comunicado, o Departamento de Estado americano destaca que os países se comprometeram a "trabalhar em parceria para deter o fluxo de drogas ilegais e se envolver em melhores práticas em matéria de prevenção, reabilitação e tratamento dos cidadãos afetados pela dependência".
O texto final do encontro declara que é preciso "incorporar a saúde pública, a educação e a inclusão social às medidas preventivas". "É necessário fortalecer os sistemas públicos de saúde, particularmente nas áreas de prevenção, tratamento e reabilitação", diz o comunicado.
Com isso, a OEA se compromete a iniciar um processo de consultas, desde discussões em nível nacional até reuniões extraordinárias do organismo com outras entidades regionais.
'ORGULHO'
A presidente Dilma Rousseff disse ontem, em nota, que a eleição do ex-ministro Paulo Vannuchi, durante a Assembleia Geral, para a diretoria da Comissão Interamericana de Direitos Humanos é "motivo de orgulho para o governo brasileiro".
"No Brasil, Vannuchi consolidou o papel institucional da Secretaria de Direitos Humanos e contribuiu para o resgate da verdade histórica sobre as vítimas da ditadura", diz Dilma.
Segundo a presidente, "sua capacidade de trabalho, seu empenho e dedicação" vão assegurar que ele dê uma "contribuição importante" à comissão da Organização dos Estados Americanos.
ANÁLISE
Encontro se torna o começo do fim da guerra às drogas
PEDRO ABRAMOVAYESPECIAL PARA A FOLHAA Assembleia-Geral da OEA, realizada na Guatemala, teve um tema central: política de drogas. Um tema que, há poucos anos, só era debatido sob o lema da guerra às drogas.Mas as críticas ao tratamento das drogas em uma lógica de guerra nunca foram tão contundentes. Um movimento que começa com ex-presidentes latino-americanos, incluindo FHC, e vem ganhando, há dois anos, a adesão de governantes em exercício como o presidente colombiano Juan Manuel Santos e o guatemalteco Otto Pérez Molina.
Há pouco mais de um ano, chefes de Estado de todo o continente americano se reuniram na Colômbia, fizeram uma declaração crítica à guerra às drogas e pediram que a OEA produzisse um relatório técnico apontando para alternativas.
O relatório foi entregue no começo do mês passado e surpreendeu muita gente ao apresentar cenários concretos e inovadores de políticas.
Entre eles, a possibilidade de que Estados possam decidir quais as políticas alternativas mais adequadas à sua realidade, sem ficar presos à camisa de força das convenções internacionais.
Este relatório também ganha força por ser lançado no mesmo momento em que dois Estados americanos acabam de legalizar a maconha e o Uruguai discute fazê-lo.
O presidente Pérez Molina não mediu esforços para que a declaração final da Assembleia fosse um marco no fim da lógica de guerra às drogas.
Recebeu, inclusive, uma petição com 180.000 assinaturas apoiando sua posição.
Sua articulação foi vitoriosa. Em primeiro lugar, porque o documento final aceitou e reconheceu a importância do relatório técnico da OEA.
Além disso, reconheceu a possibilidade de se experimentar novas alternativas baseadas em conhecimento científico.
E, por fim, recomendou que as convenções sobre drogas sejam combinadas com as convenções de direitos humanos --esta é a tese utilizada pelo Uruguai para defender a possibilidade de regulamentar a maconha sem entrar em conflito com o direito internacional.
Mas o mais importante foi a determinação de que o debate continua.
Uma Assembleia Geral específica para debater o relatório da OEA foi marcada --contrariando a posição inicial dos EUA.
Este documento é o mais crítico à atual legislação internacional de drogas já aprovado por um organismo multilateral.
A questão agora é avaliar sua capacidade de influenciar o debate nas Nações Unidas. Porém, nas palavras do embaixador uruguaio na OEA, Milton Romani, a declaração aprovada "marca o fim do pensamento único em matéria de drogas".
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