Estado de Minas - 14/07/2013
Liguei a TV em Lima, Peru, e descobri que havia
um desfile de milhares de motociclistas. Um assombro. Motocicletas de
quase 40 marcas. Mas ocorria também ali para outra coisa: o 2º Festival
Internacional de Poesia. Não é a primeira vez que motoqueiros e poetas
se reúnem (sem saber) numa cidade. Uma vez, estava em Oaxaca, no México,
para encontro de poetas, e não é que centenas de aficionados da
Harley-Davidson, com seus blusões e distintivos, tiravam retratos,
comportadinhos, em fila, diante de uma catedral!
Como dizem os
mineiros, “coisa de doido, sô!”. Imaginem mais de 100 poetas de todo o
mundo reunidos, por exemplo, numa noite de frio brabíssimo, falando
poemas para centenas de pessoas, apinhadas num anfiteatro ao ar livre,
semelhante a um teatro grego. Sair de casa, num frio desses, para ouvir
poesia, ora direis, certo perdeste o senso. E, no entanto, o público
estava também no vasto auditório do Teatro de la Nación, no Centro
Cultural Brasil-Peru, nas universidades, bares, parques, bibliotecas
etc.
Só vi coisa semelhante em Medellín, na Colômbia – outra
‘‘coisa de doido, sô!” –, que está rolando nesses dias, e que tem mais
de 20 anos de existência. Desta vez, em Lima, houve um encontro entre a
poesia e a música, pois, sendo centenário de Vinicius de Moraes, nossa
embaixada no Peru e o CCBP promoveram show de Maria Creuza interpretando
Vinicius. Essa mulher histórica saiu da Bahia pelas mãos de Vinicius e
deve estar agora em Madri, repetindo o show em que o público cantava de
memória as canções do bardo de Ipanema e adjacências.
Os jornais
brasileiros, alugados pela Flip (aquela de Paraty), não devem ter dado
notícia alguma. Pena. Já que o Brasil era o país homenageado, estavam em
Lima nove poetas brasileiros (além deste cronista que vos informa):
Iacyr Anderson, Alexandre Marino, Fabrício Marques, Fabrício Corseleti,
Sergio Cohen, Luiz Silva (Cuti), Angélica Freitas, Camila do Valle e
Lucila Nogueira. E uma coisa curiosa e informativa para quem lá não
esteve: a constatação de como Clarice Lispector está virando a escritora
brasileira mais citada e lida no mundo. Quando a poeta Doris Morimasoto
foi ler seus poemas, referiu-sa a Clarice, nada mais, nada menos, como
“la mayor escritora del mundo”. Converso com a novelista argentina Ana
Guillot e ela revela como Clarice marcou sua vida e obra. Abro o livro
do poeta uruguaio Rafael Courtoise e encontro um poema dedicado a
Clarice.
E outra coisa: o poeta Ledo Ivo é celebridade fora do
Brasil. No programa há uma foto de Ledo Ivo ao lado de Antonio Cisneros.
Desgraçadamente, como se diz em espanhol, Ledo e Cisneros faleceram
recentemente. E o 2º Festival Internacional de Poesia decidiu
homenageá-los ao lado de outros poetas que nos deixaram.
É
curioso isto. Existe uma família imponderável de poetas. Nos referimos a
Homero, Baudelaire, Whitman, Fernando Pessoa ou Rilke como irmãos ou
tios. Não é à toa que os poetas, volta e meia, vão às sepultura e às
obras de outros poetas para reverenciá-los, retomar seus versos, dar
vida à própria literatura. Pois foi apresentado um vídeo em homenagem
aos poetas que partiram. Vocês podem compatilhar desse momento através
das imagens e da bela canção na voz de Cesar Calvo, no YouTube.
Uma
homenagem especial foi feita por meio de um vídeo dedicado a Antonio
Cisneros. Aí apareço lendo um de seus poemas. Lembro-me de tê-lo trazido
ao Brasil, nos anos 1990, para se apresentar na Biblioteca Nacional.
Fizemos até um almoço de poetas para ele, num restaurante do Rio.
É
isso, minha gente: os poetas e motociclistas se reúnem aqui e ali. A
diferença é que o ruído das motos se esvai no tumulto da cidade, mas o
canto dos poetas nos guia através da vida e da história.
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