Britânico especialista em evolução humana anuncia esforço para entender origem do chamado homem de Piltdown
Anunciado há cem anos como elo perdido, fóssil era falsificação; grupo agora quer identificar fraudador, ainda ignoto
O fóssil em questão é o "homem de Piltdown", saudado em 1912 como o elo perdido por excelência -embora não passasse, na verdade, de uma mistura mal-ajambrada de ossos de humanos modernos e orangotangos.
Demorou 40 anos para que a fraude de Piltdown ficasse clara, e há uma lista dos principais suspeitos de terem perpetrado a farsa, mas ainda não dá para apontar um culpado com razoável grau de certeza. E é aí que entram Chris Stringer e seus colegas.
Stringer, pesquisador do Museu de História Natural de Londres e um dos principais especialistas em evolução humana do mundo, apresentou seu plano de investigação em artigo na última edição da revista científica "Nature".
Junto com outros 15 colegas do museu e de várias universidades britânicas, ele está usando uma série de técnicas modernas -análises químicas e de DNA, testes de carbono-14 etc.- para determinar com precisão a idade verdadeira e a origem geográfica dos fósseis forjados.
Mais importante ainda, Stringer e companhia querem saber quais métodos foram usados para envelhecer artificialmente os ossos, o que permitiu que muitos cientistas sérios da época engolissem a fraude de Piltdown.
LISTA DE SUSPEITOS
Segundo Stringer, justamente a metodologia de falsificação é que pode ajudar a equipe de "detetives" a distinguir entre os principais suspeitos da fraude.
O que ocorre é que três escavações, em dois sítios diferentes, foram responsáveis por trazer à tona os restos do homem de Piltdown.
Na primeira, a equipe liderada pelo caçador de fósseis amador Charles Dawson e pelo paleontólogo Arthur Smith Woodward achou uma mandíbula e fragmentos de um crânio, junto com ferramentas de pedra.
Na segunda escavação, vieram à tona um canino e, o que hoje parece mais ridículo, um pedaço de osso de elefante com um formato que lembrava um taco de críquete.
Finalmente, Dawson alegou ter achado mais fósseis num segundo sítio, a alguns quilômetros do primeiro.
Para Stringer, se o método de falsificação for igual para os dois sítios, isso provavelmente significa que Dawson era o mentor da fraude, porque só ele chegou a trabalhar em ambas as localidades.
Por outro lado, se o canino da segunda escavação apresentar origem diferente ou "tratamento" distinto dos outros fósseis, isso incriminaria o responsável por encontrar esse dente, alguém que se tornaria famoso: o jesuíta francês Pierre Teilhard de Chardin, que depois tentou uma junção entre a doutrina cristã e a teoria da evolução.
Também pode ser que o mais absurdo dos "achados" -o tal taco de críquete- tenha sido plantado por alguém que estava tentando deixar claro para o público que era tudo mentira.
Para Stringer, desvendar a autoria da fraude ajudará a entender as motivações do farsante e da má conduta científica de maneira geral.
Tudo indica que, se Dawson foi o responsável, ele estava simplesmente atrás de reconhecimento e prestígio.
Por outro lado, o falsário pode ter sido motivado pelo desejo de mostrar que o Reino Unido era o berço da humanidade. Ironicamente, a fraude atrasou o reconhecimento de um fóssil genuinamente espetacular, o Australopithecus africanus, achado na África do Sul e, por isso, "discriminado".
FRASE
CHRIS STRINGER
especialista em origens humanas do Museu de História Natural de Londres
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