O Globo 19/01/2013
O processo descontrolado
de expansão das cidades brasileiras pode ser visto como um dos
principais responsáveis pela acelerada degradação dos nossos ambientes
urbanos e naturais. Diante desse quadro, não há como permanecer
assistindo passivamente uma vertente do mercado imobiliário — formal e
informal — se instalar nas frágeis encostas de morros e margens de rios
desprovidas de infraestrutura. Essa forma predatória de ocupação do solo
exige dos governantes, dos políticos e das pessoas interessadas na
construção de cidades mais humanas e sustentáveis uma reflexão
desprovida de posicionamentos ideológicos desgastados. Há que se buscar a
superação do abismo que existe entre promessa e ação através de uma
perspectiva abrangente e capaz de reverter, na origem, esse quadro
desolador. Caso o Rio consiga cumprir essa tarefa, em curto prazo,
poderá se tornar um exemplo a ser seguido por outras cidades.
Infelizmente,
a falta de uma conduta social em defesa dos interesses da cidade vem
perpetuando um círculo vicioso que estimula e alimenta a degradação
urbana. É assustador observar, inclusive pelo Brasil afora, o hábito de a
população fazer vista grossa diante de atitudes que comprometem o
espaço urbano e a qualidade de vida. Até parece que ainda vivemos os
hábitos e a cultura dos tempos coloniais. Naquele tempo remoto o
desprezo pela coisa pública se justificava na medida em que a população
era excluída das decisões sobre a cidade. O povo pensava que a cidade
não lhe pertencia.
Esse antagonismo entre o colonizador e o
colonizado se instalou no inconsciente coletivo e permanece até os dias
de hoje. Só que, atualmente, tal comportamento se transferiu para as
relações entre o governo e a sociedade. A vacilante democracia no
planejamento e gestão da cidade constitui um elemento a mais para
estimular a prática de comportamentos predatórios. Qualquer indivíduo,
com o mínimo bom senso, poderá perceber o quanto essa cultura
discricionária compromete a vida urbana. A expressão “liberou geral”
traduz, com bastante clareza, a maneira como as cidades brasileiras vêm
sendo tratadas. Os comportamentos antissociais variam apenas na forma
como são praticados e independem do status econômico e social de quem os
pratica. Em ambos os casos, a cidade é usada como se fosse terra de
ninguém.
Diante dessa constatação, não há como ficar de braços
cruzados esperando que o poder público faça por nós aquilo que também
nos compete fazer. Difundir um comportamento solidário em defesa da
cidade e da cidadania é obrigação de qualquer pessoa civilizada.
Felizmente, a imprensa vem dedicando um espaço relevante para a
divulgação desses princípios e da necessidade de enfrentar com firmeza
os descalabros que ocorrem no nosso dia a dia. Mas, se essas denúncias
não alcançarem a repercussão desejada, não há dúvida de que, a exemplo
de tentativas anteriores, não passará de mais uma página virada no
noticiário cotidiano. Resta, portanto, a esperança de que a sociedade
assuma, o quanto antes, um comportamento uníssono e solidário em prol da
valorização da urbanidade e do combate à selvageria praticada pelos
costumeiros predadores urbanos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário