quinta-feira, 25 de abril de 2013

Tereza Cruvinel - Questões do acórdão‏

O acórdão da Ação Penal 470, vulgo mensalão, interessa a toda a sociedade, pelo impacto que terá sobre o ordenamento jurídico e as inflexões adotadas em matéria de julgar e condenar 


Tereza Cruvinel

Estado de Minas:
25/04/2013 


Os advogados de defesa estão lendo avidamente, em busca de brechas para os embargos declinatórios que poderão apresentar até 2 de maio, as 8 mil páginas do acórdão do STF sobre a Ação Penal 470, vulgo mensalão. A peça, a rigor, interessa a toda a sociedade, pelo impacto que terá sobre o ordenamento jurídico, a inflexão contrária à tendência mundial de fortalecer as garantias fundamentais e as alterações nos conceitos e regras até então vigentes em matéria de julgar e condenar. Isso explica boa parte das mais de mil supressões que os ministros fizeram, como lhes garante o regimento. Talvez, por exemplo, o ministro Luiz Fux tenha achado que foi longe demais na inflexão ao dizer que aos réus compete provar a inocência, trecho suprimido.

Apreciados os embargos declaratórios, e na outra fase os infringentes, teremos, como dizem eles, a coisa julgada, segundo balizas que, em princípio, deverão ser adotadas por todas as instâncias. A coisa julgada é que nos dirá, por exemplo, se para condenar por corrupção passiva bastará o recebimento de “vantagem indevida”, dispensando-se a apresentação da prova como ato de ofício, a contrapartida ilícita pelo suborno. No caso dos deputados condenados por tal crime, o ato de ofício seria o voto a favor do governo, mas o STF não examinou os votos ao ponto de estabelecer uma relação direta e indiscutível entre eles e o recebimento de recursos proporcionados pelo PT, que alega ter dado ajuda de campanha, por meio de Marcos Valério. Nesses termos, ocupar função pública trará enormes riscos. Uma carona, uma gentileza, qualquer coisa poderá ser qualificada, quiçá por um adversário, como vantagem indevida.


Será também sabido se a teoria do domínio do fato prevalecerá em sua acepção brasileira, criticada pelo próprio autor, de que o ocupante do topo da hierarquia deve ser responsável pelos ilícitos cometidos nos estamentos inferiores. O meio jurídico, até em obsequioso silêncio, talvez comece agora a debater essas questões de fundo. Em artigo publicado anteontem pelo jornal Valor Econômico, o professor doutor de direito da USP Altamiro Veludo Salvador Neto diz que uma primeira leitura do acórdão já sugere polêmica no que diz respeito à exigência de individualização das condutas. Isso significa provar quem fez o quê, problema enfrentado agora, diz ele, no julgamento dos policiais que participaram do massacre do Carandiru. “Não parece muito simples aceitar, sem divergir, responsabilizações penais fundamentadas em meros indícios, que não descrevam a conduta especificamente praticada por cada um dos imputados ou que entendam ser suficiente a ocupação de um cargo para daí extraírem as razões de julgar”, afirma ele.


O objetivo da proposta de emenda constitucional do deputado Nazareno Fonteles (PT-PI) aprovada ontem pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara é exatamente o de estabelecer um sistema de freios e contrapesos entre o Legislativo (que escreveu originalmente a Constituição e tem poder para mudá-la, exceto nas cláusulas pétreas) e o Judiciário, que tem poder para interpretá-la. Ela prevê que o Congresso aprove, em 90 dias, as propostas de súmulas vinculantes (extensão das decisões do STF a todas as instâncias). Passado esse prazo, estariam valendo. Se rejeitadas, vão à consulta popular, o poder originário. E também amplia, de oito para nove, o número de votos necessários no tribunal para a declaração de inconstitucionalidade de emendas à Carta. Uma proposta certamente polêmica, mas de alta relevância e ousadia para estes tempos de fricção entre os dois poderes.

Ela e eles

O projeto que impede a apropriação, por novos partidos, do tempo de tevê e da parcela do Fundo Partidário proporcionais aos deputados que trocaram de sigla está unindo os adversários da presidente Dilma. Para ela, a consequência pode vir no segundo turno. O presidenciável Aécio Neves carrega no bolso uma pesquisa recente, feita nacionalmente para consumo do PSDB, na qual Dilma teria hoje 52% de preferência eleitoral (inferior à aprovação de seu governo); Marina Silva teria 18%; ele, Aécio, 15%; e Eduardo Campos, do PSB, apenas 3%. Mas, somadas, as oposições teriam algo em torno de 48%. Diferença irrisória se estiverem todos juntos.

A força humana e a dos lobbies

Há projetos que parecem banais, mas fazem diferença na vida das pessoas. Se mexem com o lucro, enfrentam a força dos lobbies no Congresso e encalham. É o caso de projeto que o hoje ministro Marcelo Crivella apresentou como senador, reduzindo de 50kg para 30kg o peso de fardos como cimento, grãos e outros produtos que precisam ser carregados no ombro por operários ou estivadores. O resultado é uma epidemia de doenças de coluna, onerosas para o SUS no tratamento (20% dos atendimentos médicos) e para o INSS na concessão de auxílio-saúde.


Nas viagens internacionais, malas já não podem pesar mais que 30kg. Aprovado no Senado, o projeto passou a ser combatido pela CNI e pelas construtoras. Claro, o burro de carga humano renderá menos. O relator, deputado Antônio Balhmann (PSB-CE), pediu vistas. Sem qualquer pressa.

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