domingo, 25 de novembro de 2012

Elio Gaspari


A bancada do bem deve botar a boca no mundo
Vinte e oito senadores recusaram-se a tungar a Viúva, mas parecem constrangidos por terem feito o certo
TERMINA AMANHÃ o prazo para que os senadores decidam quem pagará o Imposto de Renda cobrado pela Receita referente aos 14º e 15º salários que receberam nos últimos cinco anos. Numa votação que durou um minuto, o plenário da Casa resolveu que essa conta é da Viúva. Coisa de R$ 22 mil para quem está no primeiro ano de mandato, chegando a R$ 90 mil para os mais antigos.
Os doutores sustentam que não devem pagar porque a Diretoria-Geral do Senado assim recomendou. Quando um empregador, ou um contador, comete esse tipo de erro, o contribuinte tem que pagar à Receita, ponto.
Os senadores não são coitadinhos. Nem pelo salário de R$ 26.723 mensais, nem pelo patrimônio de alguns deles. Antonio Russo (PR-MS), por exemplo, tem R$ 53 milhões.
Senadores que decidiram desprezar o privilégio se mantiveram na discrição dos constrangidos, como se estivessem preocupados em não deixar mal os colegas. Até sexta-feira, 28 senadores, entre eles Blairo Maggi (a maior fortuna da Casa), Aécio Neves, Aloysio Nunes Ferreira, Eduardo Suplicy, Clésio Andrade, Edison Lobão, Gleisi Hoffmann, Randolfe Rodrigues, Ana Amélia e Lindbergh Farias decidiram quitar suas contas na Receita.
Até então, o senador Antonio Russo não estava na lista.
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AUSTERLITZ E A CPI
Depois de um de seus maiores combates, Napoleão disse aos seus soldados: "Bastará que um de vocês diga: 'Eu estive em Austerlitz', para que os cidadãos exclamem: 'Ali vai um bravo'".
Caminha para o fim a CPI do Congresso que simulou investigar Carlinhos Cachoeira e seus associados. Quando ela terminar, será possível adaptar Napoleão: "Bastará que um de vocês diga: 'Eu estive na CPI do Cachoeira', para que os cidadãos exclamem: 'Ele esteve na CPI do Cachoeira'".
ESPERTEZA
A OAB defende o direito de filhos de ministros de tribunais superiores e de desembargadores advogarem livremente nas cortes onde estão os pais.
Tudo bem, mas resta saber como se resolve a seguinte encrenca: o ministro X já votou várias vezes numa direção e aparece um litígio onde, por certo, votará da mesma maneira. Como seu filho está no caso, ele se declara impedido, mas o cliente do moço queria exatamente esterilizar seu voto.
A ministra Eliana Calmon já disse a um colega: "Quem deve se declarar impedido é o seu filho, não você".
DESENCANTO
Meio século depois da crise dos mísseis de Cuba, época em que os americanos redescobriram a América Latina, os sinais que vêm de Washington informam que, tão cedo, a região não entrará na agenda do companheiro Obama.
Vai ver, é bom.
DOUTORADO
Fernando Haddad, futuro prefeito de São Paulo, passou por um curso intensivo de administração da convivência do aparelho petista com uma administração profissional. Seu mestre foi Lula, mostrando-lhe o que se pode dar e o que se deve negar.
Professor, ele teve.
MADAME NATASHA
Madame Natasha encanta-se com o ministro Joaquim Barbosa e adorou ouvir dele que o Judiciário precisa se livrar das "firulas".
Assustou-se quando ele mencionou o "gridlock econômico" do Brasil. Não há firula maior que o uso de expressions extranjeras sans razão. Poderia dizer "impasse", talvez "travas".
DE KING PARA FUX
"Ministro, obrigado pela referência ao meu discurso do 'tive um sonho'. Minha filha Bernice ouviu sua fala e me contou.
Para futuras referências, lembre-se: Eu não o pronunciei no Madison Square Garden de Nova York, mas aos pés do memorial de Abraham Lincoln, em Washington.
Martin Luther King"
FARO
De um conhecedor do Judiciário, que foi ao Congresso Brasileiro de Magistrados, em Belém, no qual reuniram-se cerca de 2.000 juízes:
"Deixando de lado o fato de que os nomes dos ministros Carlos Ayres Britto e Joaquim Barbosa eram ovacionados, os ataques dos petistas ao julgamento do mensalão resultaram num clima ruim para eles, num plenário onde dispunham de razoável simpatia".
REGISTRO
Em 2006, deu-se uma discreta articulação de ministros do Supremo Tribunal e advogados para conjurar a ascensão de Joaquim Barbosa à presidência da corte.
Medida extrema, pois os ministros chegam ao cargo por um critério meramente rotativo de antiguidade, amparava-se num precedente de 1969, quando o ministro Adalício Nogueira foi aconselhado a desistir da posição.
Quem diria.
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OS TABLETS DO COMISSÁRIO MERCADANTE, 2.0
O ministro da Educação, Aloizio Mercadante, manifesta sua "irresignação" diante do texto aqui publicado mostrando que o MEC comprometeu R$ 115 milhões para a compra de 380 mil tabuletas para professores a preços que vão de R$ 277 (US$ 134) a R$ 462 (US$ 231) cada um, enquanto na Índia fabricam-se tablets escolares por US$ 80, ou R$ 160.
O ministro pede que se "esclareça aos leitores a inexistência de qualquer indício de irregularidade ou suspeição, tendo em vista que a honra deste signatário e da instituição que dirijo foi atingida com a suspeita". Fica aqui o esclarecimento.
Mercadante informa que o pregão pelo qual foram comprados os tablets não ocorreu em sua gestão. Argumento despiciendo, pois a conta ficará para a Viúva.
Um extenso anexo compara o desempenho dos tablets brasileiros com o do indiano Aakash. Os nacionais terão tela melhor (1.024 x 600 pixels contra 800 x 480), sistema Android 4 contra a versão 2.2, o dobro de memória RAM (512 MB) e 16 GB de armazenamento interno contra 2 GB. O modelo brasileiro tem Bluetooth, duas câmeras de vídeo, compatibilidade para conexão de telefonia móvel 3G e porta para TV. Portanto, poderá funcionar como celular, capacidade que o indiano não tem. Isso não se deveu a uma incompetência do fabricante do Aakash. Resultou da decisão de dar à rede pública um equipamento barato. Usando-se metade da memória do Aakash armazena-se uma biblioteca com 20 livros didáticos. Quem quiser 3G com duas câmeras vai a uma loja e compra.
Quando a encomenda foi licitada, as tabuletas destinavam-se aos estudantes. Resta saber se eles, ou os professores, precisavam de equipamentos com essas especificações e esse preço.
A Lei de Simonsen diz que em certos casos é melhor pagar a comissão e esquecer o projeto. O texto aqui publicado não julgava o que houve na compra dos tablets. Separava 10% para "despesas eventuais". Se o comissário se ofendeu, não havendo registro de irregularidades, esses 10% poderiam ser incorporados à verba da compra de tablets a preços indianos. Nesse caso, a Viúva adquiriria mais 71.875 maquininhas, e a rede pública de ensino receberia 718 mil tablets, em vez de 380 mil. Todo mundo ficará feliz.
É a primeira vez que as quatro operações da aritmética irresignam um ministro da Educação. O problema da compra das tabuletas não está em irregularidades desconhecidas, mas na sua regularidade conhecida.

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