GIULIANA MIRANDA
DE SÃO PAULO
Comer pode ser "viciante", dar "barato" e ainda dificultar a interação em situações cotidianas. É levando esse aspecto em conta e tratando obesos como dependentes em álcool ou outras drogas que uma iniciativa está conseguindo bons resultados em São Paulo.
Em cerca de quatro meses, boa parte dos pacientes obesos atendidos pelo grupo conseguiu perder até 5% da massa corporal -uma mudança que representa melhor qualidade de vida, facilitando a agilidade, o deslocamento e a respiração.
No Gesto (Grupo de Estudo e Tratamento do Obeso), é feita uma espécie de "reabilitação" dos atendidos, envolvendo tanto a parte física quanto a psicológica.
O trabalho -não por acaso localizado no Centro de Referência de Álcool, Tabaco e Outras Drogas da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo- é conduzido por uma equipe multidisciplinar de profissionais.
Além da orientação nutricional e de atividades físicas, os pacientes necessariamente passam por sessões de terapia. Esse, que é um dos principais pilares do método, conscientiza o obeso de sua relação de dependência com a comida e daquilo que o leva à compulsão.
"A obesidade é uma doença e, como tal, exige dedicação para o tratamento. Muita gente acha que é bobagem, que é só seguir uma dieta. O obeso tem um vício em comida e ele precisa ter consciência disso", afirma a médica Maria Flora Almeida, coordenadora do Gesto.
CIRCUITO
Pesquisas já demonstraram que obesos podem apresentar alterações na química cerebral, a exemplo do que ocorre com dependentes químicos. Essas mudanças afetam o chamado circuito de recompensa do cérebro.
"É uma compulsão danada. Às vezes, a gente está mastigando e nem sabe o que está comendo", conta a auxiliar de escritório Regina Célia Neves, 50, em tratamento no grupo há um ano.
Segundo ela, o tratamento, que ocupa dois dias em período quase integral, já está dando resultados. Além de ter perdido peso (ela não revela quanto), Regina diz estar mais consciente sobre sua compulsão.
"Aprendi a saber quando tenho fome", avalia ela.
Tratar obesos como viciados, porém, não é unanimidade entre os especialistas.
Na opinião de Walmir Coutinho, membro da Sbem (Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia) e presidente eleito da Iaso (Associação Internacional para o Estudo da Obesidade), essa pode ser uma abordagem "supersimplificada".
"A obesidade é uma doença multifatorial e nem todos os obesos se enquadram nesse caso de vício e compulsão. Reduzir todo obeso a essa categoria é simplesmente equivocado."
ALTERNATIVAS
Mas nem só de terapia vive o grupo. Os pacientes também participam de visitas a museus, parques, exposições e até de workshops de culinária, além de reaprender como fazer compras na feira e no supermercado.
"Isso serve para aprender a se relacionar de uma maneira saudável com a comida. Eles aprendem que é possível estar fora de casa sem pensar o tempo todo em comida", diz Maria Flora Almeida, coordenadora do grupo.
"É uma abordagem mais individualizada. Não adianta chegar para o paciente e dar uma folha de papel com a dieta. O comprometimento muda quando compreendem a razão das alterações no cardápio", completa Flora.
Segundo a médica, esse é um dos fatores que explicam o bom resultado do grupo mesmo com o fim do acompanhamento.
Um levantamento da secretaria de Estado da Saúde indica que 80% dos pacientes que terminaram o tratamento conseguiram manter o peso perdido, mesmo um ano após o fim do tratamento no Gesto. Foram analisados 149 pacientes com idades entre 31 e 76 anos, sendo que 92% eram mulheres.
A perda de 5% do peso corporal foi observada após quatro meses de acompanhamento no grupo.
O atendimento é gratuito e aberto a pacientes obesos. É preciso entrar em contato no telefone
para agendar uma entrevista com a equipe.Editoria de Arte/Folhapress | ||
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