Imobilismo no Equador
Um dos líderes do esquerdismo que empalmou diversos governos pela América Latina, o economista Rafael Correa deve reeleger-se hoje presidente do Equador e obter a hegemonia no Congresso, livrando-se de negociar com a oposição.Pesquisas indicam que Correa alcançará os votos necessários para evitar um segundo turno. Escolhido presidente pela primeira vez em 2006 e empossado no ano seguinte, venceu todos os pleitos ligados à elaboração de uma nova Constituição e ainda foi reeleito.
Caso confirme o favoritismo agora, terá mais quatro anos e deverá completar uma década no poder. Feito impressionante -os três presidentes eleitos anteriores a ele não terminaram seus mandatos.
Boa parte de sua popularidade decorre de programas sociais financiados pelo bom desempenho da economia, que cresceu estimados 5,4% no ano passado. A base desse crescimento, porém, é frágil: dependência excessiva do petróleo.
A truculência com multinacionais, incluindo as brasileiras Odebrecht e Petrobras, e o calote na dívida externa, em 2008, afugentaram investidores externos. A fuga tem sido compensada por acordos de financiamento com a China, que somam US$ 7,3 bilhões.
Fala a favor de Correa que não tenha até aqui acirrado a polarização do país para manter-se no governo. Ele goza de níveis similares de apoio em vários níveis de escolaridade e renda, à diferença de Venezuela, Argentina e Bolívia.
O defeito que Correa compartilha com outros populistas latino-americanos é o perfil centralizador e refratário a críticas.
Nos primeiros anos de governo, fez aprovar uma Constituição que ampliou seus poderes e lhe deu o direito à reeleição. Perdeu o apoio de vários colaboradores. Dois candidatos presidenciais, hoje, são ex-aliados de Correa; um deles, Alberto Acosta, era seu braço direito e hoje o tacha de "caudilho".
O presidente também se notabilizou por perseguir críticos na imprensa. Relatório da ONG internacional Comitê para a Proteção dos Jornalistas põe o Equador entre os dez países mais problemáticos de 2012, por força da recente legislação restritiva da profissão, do exílio de quatro jornalistas ameaçados e do fechamento de ao menos 11 meios de comunicação.
Tanto tempo no cargo, sobretudo no caso de um presidente autoritário (ainda que estribado no voto popular), abala um pilar da democracia -a alternância no poder.
"Nada é tão perigoso como deixar permanecer um mesmo cidadão por muito tempo no poder. O povo se acostuma a lhe obedecer, e ele se acostuma a mandar", já preconizava o próprio Simón Bolívar.
EDITORIAIS
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Armistício no G20
Potências reunidas em Moscou decidem arquivar debate sobre a suposta "guerra cambial" denunciada pelo ministro Guido Mantega
Parecia uma vitória diplomática do ministro da Fazenda, Guido Mantega, que teve grande influência na difusão do termo após 2010. Porém, os países e as instituições financeiras mais relevantes apenas concordaram em deixar tudo como está no que se refere a políticas que afetam a taxa de câmbio.
Em 2010, Mantega criticava o efeito da política monetária americana sobre a moeda brasileira. Taxas de juro zeradas e, na prática, a "impressão" de dinheiro pelos EUA inundavam o mundo de capitais que, em parte, em busca de rentabilidade, se dirigiam ao Brasil. Tal influxo contribuía para valorizar o real, encarecer os produtos brasileiros e baratear importados, prejudicando a produção da indústria e o crescimento.
Os motivos da valorização do real entre 2008 e 2011 são complexos, mas sem dúvida a torrente de dólares liberada pelo relaxamento monetário americano foi um dos fatores determinantes. De fato, as providências do governo e do Banco Central dos EUA para estimular sua economia acabaram por desvalorizar o dólar em relação às moedas de seus principais parceiros comerciais. O iene e mesmo o combalido euro se valorizaram.
Países asiáticos adotaram medidas para se proteger do influxo excessivo de capitais. Neste ano, mesmo países mais liberais na América Latina, como México, Chile e Peru, passaram a se queixar.
Recentemente, o novo governo japonês tomou providências que, enfim, desvalorizaram o iene. Tal movimento causou certo tumulto nos mercados e sugeriu que poderia ser deflagrada uma "guerra cambial" aberta, o assunto do G20.
Mas os países mais importantes do grupo concordaram em aceitar os efeitos das políticas de seus parceiros de cúpula, posição ainda referendada pelo FMI. Não se trata de desvalorizações competitivas, mas de medidas domésticas corretas, que têm efeitos sobre câmbio e comércio. Tal dano, porém, é colateral, menor e inevitável.
Enfim, os países que podem desvalorizar suas moedas -entre outros motivos por sua inflação baixa- o farão, seja qual for o motivo.
Não se trata do caso do Brasil. Essa porta está fechada para o país: câmbio mais desvalorizado pressiona ainda mais uma inflação que está em alta. O recurso à queixa política internacional, já antes quixotesco, agora se torna insustentável depois do G20 de Moscou.
O governo terá de procurar alternativas a uma retórica que se esgotou.
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