PIB em xeque
Crescimento de apenas 0,9% indica que modelo econômico baseado no aumento do consumo e dos gastos do governo chegou ao seu limite
O crescimento do PIB no ano passado, de apenas 0,9%, foi pífio, mas não uma surpresa. Há vários meses já ficara claro que 2012 seria um ano quase perdido e que a retomada seria bem mais lenta que a apregoada pelo governo.O crescimento derivou dos fatores de sempre: consumo das famílias e gastos do governo. Ambos tiveram alta pouco superior a 3%.
Do lado do consumo, o impulso foi possível por causa do desemprego baixo e dos salários ainda em alta -mas não teve a exuberância do passado. Depois de anos de forte expansão, o crédito mais escasso e o alto endividamento do consumidor já atuam como freios.
O grande vilão foi o investimento, que caiu 4% e deve encerrar o ano abaixo de 18% do PIB.
Sob a ótica setorial, o quadro é o mesmo. Os serviços continuaram a se expandir (1,7%), ao passo que o PIB industrial, que tem forte correlação com a taxa de investimento, mostrou queda de 0,8%.
O ambiente externo ruim contribuiu para o fraco desempenho verificado nesse quesito, mas não há dúvida de que os principais problemas são domésticos. A questão essencial é de custos e competitividade, que continuam a piorar em relação a outros países. Entre 2006 e 2012, a produtividade da indústria cresceu apenas 10%.
A dicotomia entre consumo, emprego e renda bem sustentados, de um lado, e produção em baixa, de outro, persiste e surpreende. Como entender que o emprego se mantenha, num quadro de PIB indigente e aparente desindustrialização?
Uma explicação possível seria a alta dos preços de commodities e a abundância de capitais externos dos últimos anos, que ensejam um fluxo constante de divisas para o país. O Brasil, grande exportador daqueles produtos, teve um ganho estimado em 2% do PIB ao ano.
O resultado, típico de países submetidos a tal experiência, é um surto de liquidez interna. Mal canalizada, ela acaba desaguando em alta de consumo, gastos públicos e bolhas de preços de ativos, como terras e imóveis.
Com muitos recursos em circulação, vicejam por alguns anos o emprego e a renda, acompanhados porém de erosão na capacidade de competir no mercado internacional. Os salários aumentam além da produtividade, em especial no setor de serviços. A indústria, que não tem a mesma liberdade para ajustar preços (pois está submetida à concorrência de importados), fica cada vez mais pressionada.
Com o passar do tempo, porém, o empuxo externo arrefece. Ficam apenas os custos internos mais elevados. O crescimento murcha, e o modelo centrado no consumo entra em xeque. Tal é o quadro atual.
Os frutos fáceis de colher se acabaram. É chegada a hora de trabalhar para restaurar a competitividade e impulsionar o investimento -algo bem mais difícil de alcançar.
EDITORIAIS
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Pizza à paulistana
Ao engavetar o processo contra o vereador paulistano Aurélio Miguel (PR), acusado de corrupção, a Corregedoria da Câmara Municipal deu à cidade uma triste e conhecida mensagem: entre o compromisso com a ética e o espírito corporativo, os políticos, sempre que possível, ficam com o segundo.Embora a generalização possa conter uma dose de injustiça, os Legislativos, nas diversas esferas de governo, têm contribuído para que seja essa a visão predominante na sociedade.
No caso em questão, o ex-judoca é réu numa ação civil sob acusação de ter recebido propina para liberar alvará de obras do shopping Pátio Paulista. Na esfera criminal, foi denunciado por supostamente exigir dinheiro para não citar funcionários de shoppings e da empresa Brookfield no relatório da CPI criada em 2009 para apurar irregularidades em lançamentos do IPTU, por ele presidida.
Conforme reportagens publicadas nesta Folha, o patrimônio do vereador floresceu de maneira notável nos últimos anos. Além de uma lancha e de 17 automóveis, possui 25 imóveis, no valor de R$ 25 milhões, em seu nome ou nos de suas duas empresas -oito deles adquiridos em espécie.
Quando foi eleito pela primeira vez, no ano de 2004, o ex-atleta -que conquistou medalha de ouro na Olimpíada de Seul- possuía apenas R$ 1,4 milhão em bens, em valores atuais.
São indícios que, sem dúvida, justificam a iniciativa de submetê-lo a uma apuração na esfera legislativa. Não foi, entretanto, o que considerou o vereador Milton Leite (DEM), relator do processo na corregedoria. Em sua avaliação, as evidências seriam "frágeis" e restritas a "recortes de jornais". Instado a requisitar provas reunidas pelo Ministério Público, o corregedor-geral da Câmara, Rubens Calvo (PMDB), negou-se a fazê-lo.
Um fato que antecedeu a decisão chamou a atenção pelas mal disfarçadas insinuações: Aurélio Miguel assinalou que foi presidente da CPI do IPTU, e não seu relator. A manifestação acabou interpretada como tentativa de dissuadir aliados do prefeito Fernando Haddad de levar o caso adiante, pois a relatoria daquela comissão foi ocupada por Antonio Donato (PT), hoje secretário de Governo do novo prefeito.
Consumada a "pizza" legislativa, volta-se para a Justiça a expectativa de que as acusações contra Aurélio Miguel sejam esclarecidas.
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