terça-feira, 19 de março de 2013

Intérprete da realidade - Ailton Magioli

Francisco Bosco conta que passou a escrever para lidar com o cotidiano. Escritor lança hoje o livro Alta ajuda 


Ailton Magioli

Estado de Minas: 19/03/2013 

Francisco Bosco, de 36 anos, recorre a postura contrária à do então ministro da Educação, Eduardo Portella, autor da clássica frase “eu não sou ministro, estou ministro”, para se posicionar publicamente. Atração do Projeto Sempre um Papo hoje à noite, no Teatro Oi Futuro Klaus Vianna, onde lança o livro Alta ajuda, o jovem poeta, letrista, filósofo e escritor carioca gosta de dizer que ele não está professor, mas é professor. “Embora desvinculado da universidade, dou diversos cursos e palestras, e não me considero menos professor do que ensaísta”, justifica o filho do cantor e compositor João Bosco, que volta a encarar o denominado “público leitor” ao vivo, mais uma vez, embora deteste a própria expressão.

“Estou sempre em contato com o leitor já que, para mim, leitor é toda e qualquer pessoa que tem a generosidade e a curiosidade de ouvir minhas ideias”, acrescenta Francisco Bosco. Para ele, o interesse do leitor quando vai ao encontro do autor é quase que exclusivo pelas ideias dele, não por sua pessoa.

 “Não sou um leitor de biografias, por exemplo. As maiores biografias que conheço são as de Ulisses por Homero; de Dom Quixote por Cervantes; de Bentinho por Machado. Escrever a vida (biografar) é tarefa difícil, e são os ficcionistas, muito mais do que os biógrafos, quem dominam essa arte”, afirma.

Privilégios Como filho de artista, Francisco também faz questão de dizer que é mais um fã (“e dos maiores”) do pai João Bosco. “O que lamento é a obsessão que a mídia costuma ter com essa coisa de ‘filhos de famosos’ . É uma redução da dimensão pública à dimensão privada, do mundo das ideias ao mundo da fofoca. Subestima o leitor, pois parte do princípio de que o interesse dele é sempre voltado para o plano íntimo, o que é infantilizador”, lamenta.

“E ainda há nisso um princípio de transmissão de privilégios que, me parece, reproduz privilégios históricos na sociedade brasileira. E essa reprodução, por sua vez, logo se revira em vingança social: a mídia incentiva isso, para depois vingar-se, julgando com severidade redobrada os "filhos de famosos". Hoje em dia, isso só ocorre comigo residualmente, mas já foi forte”, acrescenta. Para o escritor, o contato fundamental entre autor e leitor é por meio do livro.

“Um autor é um autor por causa de sua obra; logo, se você quer conhecer um autor, deve conhecer sobretudo sua obra. No meu caso, minha obra pode ser conhecida por meio da minha fala tão bem quanto por meio dos meus livros (o mesmo não ocorre com ficcionistas e poetas)”. “Dito isso”, prossegue Francisco, “é claro que há sempre um charme especial no contato físico com um autor. Os autores que mais admiro, tenho sempre vontade de conhecer o grão da sua voz, seus gestos, o conjunto expressivo da sua pessoa”, admite.

Tudo e nada Sobre a naturalidade de refletir sobre o tudo e o nada, atribuída a ele pelo também autor José Miguel Wisnik, diz: “De um lado isso vem da minha história pessoal. Não sou um intelectual de gabinete; tornei-me escritor por necessidade urgente de interpretar a realidade à minha volta, que, muitas vezes, me feria. Sartre dizia, a propósito, que a criação não é um dom, mas uma saída que se inventa em situações desesperadas. Por outro lado, isso também se deve a meu encontro decisivo com a obra de Roland Barthes. Foi ele quem me ensinou que os fenômenos mais banais estão cheios de sentidos insuspeitados”.

Uma das maiores virtudes da web, segundo Francisco Bosco, tem sido a aproximação do autor de seus leitores. “A cultura se descentralizou e globalizou. Hoje, os artistas e intelectuais podem disseminar suas obras sem necessariamente passar pelas instâncias tradicionais de filtragem. No mundo digital, ninguém mais sofre de solidão subjetiva”, garante o escritor, para quem as redes sociais são a televisão do século 21. “Com a inestimável vantagem de que sua programação não é orientada por uma única ideologia nem por razões de mercado. Aprendo muito por meio das redes sociais.”

Depois de reunir em Alta ajuda os textos que escreveu ao longo dos últimos seis anos, publicados em jornais e revistas, Francisco anuncia que o próximo livro terá reunião de ensaios mais longos, que ele vem escrevendo também nos últimos tempos. “Mas ainda vai demorar”, avisa. Sobre a presença da poesia em sua obra, ele considera que ela vive no ensaísmo que pratica: “Meus textos são, como costumam ser os poemas, bem próximos da vida”.

FRANCISCO BOSCO – SEMPRE UM PAPO
Lançamento do livro Alta ajuda e bate-papo com o escritor, hoje, 20h, no Teatro Oi Futuro Klauss Vianna, Av. Afonso Pena, 4.001, Mangabeiras. Entrada franca. Informações: (31) 3261-1501

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