Zero Hora - 20/01/2013
A história resumida: uma amiga estava há dois meses saindo com um homem
bacana. Ele, perdulário em declarações de amor, a convidou para ir a
Paris. Ulalá. Ela vibrou. Dez dias antes do embarque, ele mandou um
e-mail dizendo que havia voltado para a ex-mulher.Sacanagem, pensamos.
Mas sacanagem talvez seja um diagnóstico simplista.
Ele estava tentando dar um novo rumo à sua vida, porém não contava
com o assédio da ex-esposa, seu verdadeiro grande amor. Fez sua opção, e
quem morreu um pouco foi minha amiga. Alguém sempre paga o pato. O
assunto de hoje é uma velha conhecida de todos nós: a frustração. Jogue a
primeira pedra quem já não caiu do cavalo (foi frustrado) ou roeu a
corda (frustrou alguém). Somos todos experts em sonhos desfeitos.
Existe coisa pior na vida, claro que existe, mas considero a
frustração uma das sensações mais indigestas. O emprego é seu! Chegando
ao escritório para entregar seus documentos, descobre que o posto já foi
preenchido. Você quase passou no vestibular! Por uma vaga, umazinha só,
ficou de fora do listão. A bolsa para estudar na Inglaterra saiu!
Pena que o governo decretou um depósito compulsório de última hora e
você não tem como pagá-lo. A garota que você está a fim chamou para a
festa! Chegando lá, encontra a bisca agarrada no seu melhor amigo. Me
veio à cabeça mais uns 456 exemplos de frustrações, algumas baseadas em
experiências pessoais. Mas você tem sua própria lista para recordar, não
serei tão cruel. O fato é: durma-se com esse embrulho no estômago.
É sabido que uma das regras de bem educar uma criança é ensiná-la a
lidar com frustrações. Seu bebê amado não será alto o suficiente para
ser um campeão de basquete, nem sua lindinha terá as melenas loiras
necessárias para ser a princesa do teatrinho da escola. Ou você mente e
desvirtua a situação para aplacar a dor dos seus rebentos, ou permite
que eles enfrentem essa dolorosa seleção natural e explica: não é isso
que mede a importância de alguém.
Papai e mamãe te amam de qualquer jeito. Grande prêmio de
consolação, pensam os baixotes.Porém, baixotes, é isso mesmo. “Papai e
mamãe te amam” é tudo o que vocês precisam saber para se lixar para as
coisas que não dão certo. E acreditem: um bilhão de coisas não darão
certo, dos cinco aos 105 anos.
Só tendo sido suficientemente amado e protegido dentro do lar para
entender que o que não deu certo é uma contingência da vida e que,
dependendo do nosso grau de autoconfiança, poderá causar apenas cinco
dias de mau humor em vez de uma dor existencial infinita.
Acredite: os cinco dias de frustração não farão mal nenhum a seu
crescimento, pelo contrário, será parte fundamental dele. A dor
existencial é que nos engessa e paralisa para sempre. Lido
razoavelmente bem com frustrações.
Sofro os cinco dias protocolares, e depois retiro delas alguma lição
que me torne mais aderente a decepções futuras – ambiciono chegar ao
dia em que a frustração não doerá nem mais cinco minutos. Conseguirei?
Na verdade, não pretendo colecionar frustrações para quebrar meu
recorde de resistência. Se pudesse, não sofreria mais nenhuma. Mas isso
equivaleria a não estar mais disposta a viver. Então, que venham as
danadas. Uma de cada vez, que sou forte, mas não sou duas.
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