Tereza Cruvinel
Estado de Minas: 20/01/2013
Uma névoa desinformativa cerca o projeto Brasília-2060, lançado pelo governador Agnelo Queiroz, para o qual foi firmado um acordo de cooperação (não um contrato) entre a Terracap e a Jurong, de Cingapura, duas empresas estatais. Quando um projeto produz tal algaravia, com vozes indistintas dizendo coisas incongruentes, é sinal de que falta ainda um debate amplo e qualificado para embasar os apoios ou as críticas.
A nebulosa desinformativa, que deve conter venenos eleitorais com vistas a 2014, gerou denúncias de ameaças ao patrimônio urbanístico, artístico e arquitetônico da capital. O governador e o acordo de cooperação falam de um projeto de desenvolvimento social e econômico para o Distrito Federal e seu entorno nas próximas décadas, não de intervenções urbanísticas ou arquitetônicas, como denunciam o Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB) e os preservacionistas, nas asas projetadas por Lúcio Costa, que abrigam as obras de Oscar Niemeyer e as criações de Athos Bulcão, Alfredo Ceschiatti, Bruno Giorgi e outros artistas. O debate do projeto exige a compreensão do ontem e do hoje da capital e da região.
A ideia da interiorização da capital passou pelas mentes de Tosi Colombina (1750), do Marquês de Pombal (1761), de José Bonifácio (1823) e de Adolfo de Vanhagem (1877), que, após cruzar o “sertão” quase inabitado, propôs ao imperador uma capital entre as três lagoas: a Feia, a Formosa e a Mestre D’Armas. Brasília acabou ficando 40 quilômetros antes delas.
Recordando: veio a República, o presidente Floriano mandou para o Planalto Central a Missão Cruls. Em 1917, decreto de Epitácio Pessoa autorizou o início das obras. Limitou-se a erigir, em Planaltina, perto das lagoas, a Pedra Fundamental. Meu avô por lá passava nos anos 20, levando para Minas o gado barato de Formosa, que vinha do Maranhão. Ele e os tropeiros olhavam a pedra e diziam: “Daonde que terá capital aqui um dia!?”. A ideia deu uns passos com Vargas e Dutra até que Juscelino Kubitschek lhe desse ousada concretude, que mudou o eixo do país. Deixamos de ser um país-caranguejo, com o povo e o desenvolvimento presos à costa. Entre os que comeram poeira fazendo a cidade, funcionários transferidos e outros chegantes, viviam na região 140 mil almas na inauguração.
Mas, em 50 anos, a roda girou novamente. No ano 2000, a cidade deveria ter 500 mil habitantes. Já tinha 2 milhões. Agora, a quarta cidade mais populosa do país tem 2,6 milhões de moradores, dos quais 75% vivem nas 17 (ou são 18?) cidades satélites; 72% desta população trabalham no Plano Piloto. Haja transporte, trânsito e infraestrutura urbana para este ir e vir diário. Para completar, 20 municípios goianos formam um entorno que depende do DF para quase tudo: emprego, saúde, educação. A segurança, de responsabilidade difusa, favorece a criminalidade. E ainda há o segundo círculo, de municípios goianos e mineiros, que também pressionam o DF.
O projeto de Agnelo pode merecer ajustes e pede debate, mas responde ao essencial: criar eixos de desenvolvimento que, pelo contrário, preservem a Brasília-sonho, oferecendo alternativas para esta população crescente. O Estado não tem como gerar mais empregos públicos. O surgimento de um setor privado forte exige projetos e investimentos. O Brasília-60 prevê uma cidade aeroportuária para o lado de Planaltina; o polo logístico, entre Samambaia e Recanto das Emas; o centro financeiro internacional, para o lado de São Sebastião, e a ampliação do polo JK, em Santa Maria. O polo de tecnologia digital, perto da Granja do Torno, já planejado, anda na frente.
Agnelo contrapõe seu projeto estratégico aos ensaios de governos anteriores: o que houve antes foram experiências infrutíferas e danosas, que consumiram um dos ativos mais valiosos do DF, a terra, como o Pró-DF. Este, todos conhecemos. Empresários arremataram lotes por valores irrisórios, supostamente para montar empreendimentos. Muitos fizeram um galpão embaixo e quitinetes em cima, fazendo surgir regiões residenciais no lugar errado, com cara de cortiço: SOF e Setor Bernardo Sayão são exemplos. No Brasília-60 as terras continuariam sendo da Terracap, que receberia dividendos dos empreendimentos.
Agnelo justifica a escolha da Jurong pela expertise em alavancar projetos regionais, especialmente nas áreas florescentes da China. Talvez tenha pesado o fato de, sendo estatal, livrar-se dos flagelos de uma licitação. A empresa é estrangeira, mas não tão estranha. No governo de Aécio Neves em Minas, foi consultora na criação do eixo econômico Belo Horizonte-Confins, que atraiu R$ 4 bilhões em 3,5 anos. A hora é de conhecer melhor e debater o projeto que pode ter tanto impacto sobre nossa região.
Sem lamentos
Na semana passada arderam sob o fogo amigo o ministro Mantega e o candidato do PMDB a presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves. A presidente Dilma bancou o ministro, informou que ele fica tanto aos empresários reticentes como aos membros de sua equipe, que estavam de olho na cadeira de Mantega. Manteve distância regulamentar da disputa no Congresso, mas, no íntimo, não lamentou os percalços de Alves nem os de Renan Calheiros. Se o PMDB já será tão forte no Congresso, pelo menos eles não chegarão ao comando das duas Casas com o pescoço muito grosso.
A nebulosa desinformativa, que deve conter venenos eleitorais com vistas a 2014, gerou denúncias de ameaças ao patrimônio urbanístico, artístico e arquitetônico da capital. O governador e o acordo de cooperação falam de um projeto de desenvolvimento social e econômico para o Distrito Federal e seu entorno nas próximas décadas, não de intervenções urbanísticas ou arquitetônicas, como denunciam o Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB) e os preservacionistas, nas asas projetadas por Lúcio Costa, que abrigam as obras de Oscar Niemeyer e as criações de Athos Bulcão, Alfredo Ceschiatti, Bruno Giorgi e outros artistas. O debate do projeto exige a compreensão do ontem e do hoje da capital e da região.
A ideia da interiorização da capital passou pelas mentes de Tosi Colombina (1750), do Marquês de Pombal (1761), de José Bonifácio (1823) e de Adolfo de Vanhagem (1877), que, após cruzar o “sertão” quase inabitado, propôs ao imperador uma capital entre as três lagoas: a Feia, a Formosa e a Mestre D’Armas. Brasília acabou ficando 40 quilômetros antes delas.
Recordando: veio a República, o presidente Floriano mandou para o Planalto Central a Missão Cruls. Em 1917, decreto de Epitácio Pessoa autorizou o início das obras. Limitou-se a erigir, em Planaltina, perto das lagoas, a Pedra Fundamental. Meu avô por lá passava nos anos 20, levando para Minas o gado barato de Formosa, que vinha do Maranhão. Ele e os tropeiros olhavam a pedra e diziam: “Daonde que terá capital aqui um dia!?”. A ideia deu uns passos com Vargas e Dutra até que Juscelino Kubitschek lhe desse ousada concretude, que mudou o eixo do país. Deixamos de ser um país-caranguejo, com o povo e o desenvolvimento presos à costa. Entre os que comeram poeira fazendo a cidade, funcionários transferidos e outros chegantes, viviam na região 140 mil almas na inauguração.
Mas, em 50 anos, a roda girou novamente. No ano 2000, a cidade deveria ter 500 mil habitantes. Já tinha 2 milhões. Agora, a quarta cidade mais populosa do país tem 2,6 milhões de moradores, dos quais 75% vivem nas 17 (ou são 18?) cidades satélites; 72% desta população trabalham no Plano Piloto. Haja transporte, trânsito e infraestrutura urbana para este ir e vir diário. Para completar, 20 municípios goianos formam um entorno que depende do DF para quase tudo: emprego, saúde, educação. A segurança, de responsabilidade difusa, favorece a criminalidade. E ainda há o segundo círculo, de municípios goianos e mineiros, que também pressionam o DF.
O projeto de Agnelo pode merecer ajustes e pede debate, mas responde ao essencial: criar eixos de desenvolvimento que, pelo contrário, preservem a Brasília-sonho, oferecendo alternativas para esta população crescente. O Estado não tem como gerar mais empregos públicos. O surgimento de um setor privado forte exige projetos e investimentos. O Brasília-60 prevê uma cidade aeroportuária para o lado de Planaltina; o polo logístico, entre Samambaia e Recanto das Emas; o centro financeiro internacional, para o lado de São Sebastião, e a ampliação do polo JK, em Santa Maria. O polo de tecnologia digital, perto da Granja do Torno, já planejado, anda na frente.
Agnelo contrapõe seu projeto estratégico aos ensaios de governos anteriores: o que houve antes foram experiências infrutíferas e danosas, que consumiram um dos ativos mais valiosos do DF, a terra, como o Pró-DF. Este, todos conhecemos. Empresários arremataram lotes por valores irrisórios, supostamente para montar empreendimentos. Muitos fizeram um galpão embaixo e quitinetes em cima, fazendo surgir regiões residenciais no lugar errado, com cara de cortiço: SOF e Setor Bernardo Sayão são exemplos. No Brasília-60 as terras continuariam sendo da Terracap, que receberia dividendos dos empreendimentos.
Agnelo justifica a escolha da Jurong pela expertise em alavancar projetos regionais, especialmente nas áreas florescentes da China. Talvez tenha pesado o fato de, sendo estatal, livrar-se dos flagelos de uma licitação. A empresa é estrangeira, mas não tão estranha. No governo de Aécio Neves em Minas, foi consultora na criação do eixo econômico Belo Horizonte-Confins, que atraiu R$ 4 bilhões em 3,5 anos. A hora é de conhecer melhor e debater o projeto que pode ter tanto impacto sobre nossa região.
Sem lamentos
Na semana passada arderam sob o fogo amigo o ministro Mantega e o candidato do PMDB a presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves. A presidente Dilma bancou o ministro, informou que ele fica tanto aos empresários reticentes como aos membros de sua equipe, que estavam de olho na cadeira de Mantega. Manteve distância regulamentar da disputa no Congresso, mas, no íntimo, não lamentou os percalços de Alves nem os de Renan Calheiros. Se o PMDB já será tão forte no Congresso, pelo menos eles não chegarão ao comando das duas Casas com o pescoço muito grosso.
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