Artistas consagrados da MPB e do pop se
dedicam a projetos voltados para crianças. Márcio de Camillo compõe
canções feitas a partir dos poemas de Manoel de Barros
Ana Clara Brant
Estado de Minas: 03/03/2013
Eles estão acostumados a cantar e a
tocar rock, pop, samba e MPB e descobriram que estes gêneros podem
agradar não só aos adultos, mas também às crianças. Adriana Calcanhotto,
Pato Fu, Edgar Scandurra e Arnaldo Antunes são alguns dos artistas que
viram na garotada um mercado promissor e interessante – sem abrir mão da
qualidade. A cantora e diretora de arte Taciana Barros, que integrou a
Gang 90, grupo de rock dos anos 1980, se reuniu com Scandurra, Antunes
(que não faz mais parte do grupo fixo e hoje atua como convidado
especial) e o músico Antonio Pinto para gravar disco com os filhos.
Nascia ali um projeto que conseguiu repercussão e sucesso de crítica e
público: Pequeno Cidadão. “Não esperávamos nada. Gravamos o CD e
decidimos fazer, pelo menos, um show de lançamento. Só que nos
divertimos muito com aquilo e sentimos também grande receptividade do
público. Naturalmente fomos crescendo e novas ideias surgiram, como o
DVD de animação e os livros”, lembra Taciana.
O resultado
surpreendeu os próprios integrantes e eles não imaginavam que a tal
“música psicodélica para criança”, mesclando pop e rock, ia agradar
tanto aos pequenos. “Outra boa surpresa que tivemos foi perceber que as
nossas apresentações são para a família toda, que todos vão lá e se
divertem muito. Os pais participam tanto quanto os filhos e isso para a
gente é bem legal, porque o mesmo acontece no palco entre nós”, constata
a artista. O êxito é tamanho que este ano o Pequeno Cidadão vai virar
filme com roteiro de Rafael Gomes e participação de Malu Mader e Eduardo
Moscovis. Outra novidade é o lançamento em maio do livro SK8: o guia do
pequeno skatista cidadão, pela Companhia das Letrinhas, com ilustrações
do artista mineiro Jimmy Leroy.
Para Taciana Barros, não há
muita diferença entre fazer música para crianças e adultos e o que muda
realmente é a temática. “No nosso caso, tocamos um som que curtimos,
independentemente de ser para criança ou adulto. O que muda é o que
estamos falando, porque aí, no meio dos solos de guitarra e de tantos
sons e backings, entra a hora de largar a chupeta, a criança no carro
querendo saber se já está chegando, o quarto que vira uma galáxia, rimas
malucas etc.”, explica.
MPB
Considerada
uma das precursoras no mercado infantil, a cantora e compositora
Adriana Calcanhotto lançou há quase 10 anos o Adriana Partimpim, no qual
usa o apelido de infância. Com a voz doce que já havia conquistado os
adultos, a artista gaúcha cria um universo lúdico e inocente voltado
para o desenvolvimento cultural da criança, e apresenta o que há de mais
rico na MPB, em versão voltada para os pequenos. O projeto já está em
seu terceiro produto, o Partimpim três, lançado no ano passado.
Quem
também embarcou nessa onda foi o Pato Fu responsável pelo Música de
brinquedo, que como o nome sugere, traz o grupo mineiro recriando
clássicos do repertório nacional e internacional apenas com o uso de
instrumentos infantis. A iniciativa deu tão certo que rendeu CD, DVD,
turnês e fez com que o Pato Fu também apresentasse versões infantis para
os seus maiores sucessos, como Made in Japan e Sobre o tempo.
Encantos do Pantanal
Quando,
há cinco anos, o músico sul-mato-grossense Márcio de Camillo procurou
Manoel de Barros para pedir permissão para o projeto que pretendia
fazer, o poeta, de 96 anos, foi incisivo: “Faça com calma!”. O objetivo
era musicar poemas de Barros em um disco voltado para o universo
infantil. Crianceiras traz 12 faixas e conta com a participação de
várias crianças, inclusive a filha de Márcio, Mariah, que canta na
belíssima e divertida Sombra boa. “Tive muito cuidado com a obra dele e
Manoel respaldou tudo e aprovou. Vários artistas já tinham musicado seus
versos, mas nunca voltado para a meninada. E não é um CD só dedicado às
crianças, mas para a criança interior, aquela coisa inocente que cada
pessoa tem e guardada dentro de si”, comenta o artista.
O álbum –
indicado como um dos três melhores discos infantis de 2012 – chegou a
provocar um fato inusitado. Pela primeira vez, Manoel de Barros viu o
bisneto, de apenas 2 anos, recitar uma de suas poesias, e ficou
emocionado. Crianceiras se transformou em espetáculo que envolve música,
dança, cinema de animação e está sendo trabalhado por educadores em
escolas de todo o país. “O Manoel de Barros costuma dizer que a poesia é
voar fora da asa. E eu digo que o Crianceiras é a asa da poesia, porque
estamos levando a palavra dele para longe. O objetivo principal é o
cunho pedagógico. Sempre achei que a educação seria o caminho e queria
ensinar poesia de uma maneira criativa”, ressalta Márcio, que contou
ainda com a participação da filha do poeta, Martha Barros, que ilustrou a
capa e o encarte do CD.
Na opinião de Márcio de Camillo, há um
estereótipo de produtos voltados para crianças que não as tratam como
deveriam e deixam de buscar a inteligência. “Tem essa ideia de que eles
gostam de amarelo, de rosinha; e criança gosta também do cinza e do
marrom. Criança é inteligente e acho que temos que trabalhar mais isso e
voltar a arte para dentro das escolas, ou seja, aproximá-las da
literatura, da música, da poesia”, defende.
Já Taciana Barros,
do Pequeno Cidadão, acredita que existe um universo grande de produtos
no mercado infantil de música, tanto boa quanto ruim, e que é importante
saber diferenciar. “Lembro do meu filho Daniel, com 6 anos, ouvindo
música no fone. Perguntei o que era e ele respondeu: “Dimi Endix!” (Jimi
Hendrix). Acho importante que artistas que lancem produtos para criança
tenham trabalhos consistentes anteriores. Isso pode diferenciar um CD
com qualidade e densidade musical de uma porcaria gravada por uma
pseudocantora que, na verdade, é apresentadora de TV e não faz a menor
ideia do que é música de verdade. E cabe aos pais exercer esse papel”,
aconselha.
Para saber mais
Crianceiras: www.crianceiras.com.br
Pequeno Cidadão: www.pequenocidadao.com
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