domingo, 3 de março de 2013

Jaime Spitzcovsky

folha de são paulo

A água que não molha


Proliferam aplicações estapafúrdias do mundo virtual. Conheci recentemente a possibilidade de manter na tela do computador um aquário com bomba de oxigênio, controle de temperatura e luz e cálculo de pH da água. E, se o internauta dominar a alquimia do aquarismo, os peixes ainda se reproduzirão.
O mundo do aquário digital, seco e sem os riscos de um peixe pular para fora do recipiente, invade também a tela do celular e de outros aparelhos. Acessei um site que se gaba por oferecer peixes virtuais que abrem a boca e mexem os olhos. E admiradores da vida aquática atingidos por uma preguiça atroz não precisam se preocupar, pois as benesses tecnológicas já incluem alimentadores automáticos.
Ilustração Tiago Elcerdo
Como um usuário bastante moderado das mordomias "high tech", optei por um aquário de verdade. Montei-o há cerca de dois anos e, depois de uma pesquisa extensa por lojas especializadas, optei por um de água de doce, voltado a peixes originários da região amazônica.
Apaixonei-me pelo acará-disco, que carrega o epíteto de "rei do aquário". Parece mesmo um monarca, graças à sua impressionante variedade e intensidade de cores e à movimentação elegante. Tem um temperamento descrito como "pacífico" e precisa dividir a água com peixes que vivam na mesma sintonia.
Tenho dois exemplares, um de tonalidade avermelhada, do grupo chamado de "red malboro", e outro que mistura turquesa e vermelho, num show de vivacidade. Mostram também grande sentido de alerta ao identificar a possibilidade da chegada de alimentos. Quando alguém se aproxima do aquário, costumam ir ao encontro do vidro, esperando por ração ou outra guloseima.
Já tive o enorme dissabor de perder alguns peixes, discos e outros menores. Mas, apesar dos momentos tristes, ainda é muito melhor um aquário com desafios reais do que uma versão virtual, com controle do habitat nos toques do teclado.
Jaime Spitzcovsky
Jaime Spitzcovsky, jornalista, foi correspondente da Folha em Moscou e em Pequim. Escreve sobre animais de estimação aos domingos, a cada duas semanas, na revista 'sãopaulo'.

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