O sermão de Mantega ao FMI
Incidente sobre ajuda à Grécia serve para mostrar plena sintonia entre os governos Dilma e Obama
Mantega aproveitou o mal-entendido com Paulo Nogueira Batista Jr., o representante brasileiro e de um punhado de outros países latino-americanos no Fundo Monetário Internacional, para dizer ao FMI que "o programa de resgate da Grécia e de outros países da periferia da zona euro precisa ser revisto de forma a permitir melhores oportunidades de recuperação para tais países" (refere-se, essencialmente, a Espanha e Portugal, além da Grécia).
Como se sabe, o programa do Fundo prevê duros ajustes que, em vez de resgatar tais países, ajudaram a afundá-los na recessão.
Nogueira Batista dissera a mesmíssima coisa, acrescentando que, no ritmo em que vão as coisas, a Grécia não conseguirá pagar suas dívidas e terá que recorrer a um novo calote, inclusive na dívida para com o FMI. A divergência se deu porque Nogueira Batista votou contra a liberação de mais uma fatia do socorro à Grécia, com o que Mantega não concordou.
É razoável supor que, na fase atual da economia brasileira, que não entusiasma ninguém além de Mantega e Dilma, o sermão do ministro ao Fundo pode parecer pretensioso. Não é.
O programa para a Grécia é de fato um tremendo fracasso. Algumas provas: o país está entrando no sexto ano de recessão, com o que sua economia sofrerá, no total, uma retração de um quarto, coisa que só países em guerra conhecem; em maio, o desemprego bateu de novo o recorde, atingindo 27,6%, outro indicador que só mesmo catástrofes conseguem produzir; a dívida, que, no momento do pacote de resgate, girava em torno de 163% do PIB, vai bater neste ano em 176%.
Mesmo que o sermão de Mantega fosse pretensioso, estaria em companhia ilustre, a do presidente Barack Obama. Ao receber o primeiro-ministro grego, Antonis Samaras, na quinta-feira, Obama também constatou que "políticas focadas só em redução de gastos não ajudariam a Grécia a retornar à prosperidade econômica".
O presidente norte-americano não nega a importância do ajuste fiscal, mas diz que igualmente importante é o foco em crescimento e em emprego.
Vê-se, pois, que, a dois meses do encontro que terão na Casa Branca, em outubro, os governos Dilma e Obama continuam em plena sintonia no campo econômico, divergências sobre espionagem à parte.
No fundo, repete-se uma situação que vem sendo recorrente nas cúpulas recentes do G20: os Estados Unidos, com apoio integral do Brasil, pressionando a Europa para um arranjo capaz de combinar austeridade com crescimento econômico.
O problema é que nem Obama nem Dilma nem Mantega conseguiram pôr de pé uma proposta que seja capaz de devolver o crescimento aos países que estão em crise ou de acelerar o crescimento em seus próprios países.
crossi@uol.com.br
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