Estado de Minas: 09/12/2012
Se um vento de bom senso não soprar nas próximas horas, a democracia brasileira experimentará uma crise institucional digna do nome, caso o Supremo Tribunal Federal confirme amanhã as cassações de deputados condenados no julgamento do mensalão, praticamente anunciadas na quinta-feira. Apesar da delicadeza e da gravidade do tema, até agora o debate ficou restrito a três personagens: o ministro presidente e relator da ação, Joaquim Barbosa, que sustenta o poder do STF para cassar mandatos (embora nunca tenha feito isso sob a atual Constituição); o revisor Ricardo Lewandowski, que tentou, angustiadamente, explicar, na quinta-feira, a violação constitucional que isso representaria; e o presidente da Câmara, Marco Maia, reiterando que não cumprirá tal determinação, em observância ao que diz o artigo 55. Onde estão os outros? Onde estão os demais guardiões da democracia? Essa briga não é da Câmara e não é dos chamados mensaleiros. É da democracia brasileira.Quando um país cria um herói, passa a entender como vilões os que discordam dele. A sustentação de que não cabe ao STF, e sim ao Congresso, cassar o mandato de deputados ou senadores condenados passa a ser vista como “defesa dos mensaleiros”, ou da permanência dos três condenados na Câmara. Lewandowski não foi feliz em sua argumentação, embora tenha apresentado elementos torrenciais, tanto doutrinários quanto originários da jurisprudência do próprio STF. Por conta de seu posicionamento e das críticas às inovações adotadas no julgamento do mensalão, neste tempo de intolerância cacarejante contra o pensamento divergente, foi tomado mais uma vez como condescendente, quiçá como aliado dos réus. Não se trata de um arbítrio da Câmara, de cassar se quiser. Diz o artigo 55 que ela tem que abrir o processo de cassação de todo deputado condenado judicialmente, após o trânsito em julgado. Isso vale para Valdemar Costa Neto (PR-SP), Pedro Henry (PP-MT) e João Paulo Cunha (PT-SP), condenados no mensalão, e também para o deputado Natan Donadon (PMDB-RO), recentemente condenado a 13 anos. Como ele recorreu, a Câmara tem que esperar o trânsito.
Lewandowski não parece ter convencido a maioria dos cinco, embora tenha citado autores em profusão e ressuscitado votos anteriores de vários ministros sobre a questão, sustentando a prerrogativa das casas parlamentares para cassar seus pares. Inclusive um do ministro Celso de Mello, que agora é um dos quatro que devem seguir Barbosa. Os outros são Marco Aurélio Mello, Luiz Fux e Gilmar Mendes. Quando tentou explicar que essa baliza da doutrina democrática vem da Revolução Francesa, ao liquidar com o poder real de destituir membros das cortes, Barbosa lhe perguntou: “E o que isso tinha a ver com a França moderna?” Data vênia, tudo a ver com todas as democracias.
Não houve debate mas demarcação de terrenos. No Congresso, afora Marco Maia, todos viraram avestruz e enfiaram a cabeça na areia. Um sinal vem do PSDB: “Estamos preocupados com o risco real de crise institucional. Na segunda-feira, o partido vai examinar o assunto e se posicionar”, diz o deputado Marcus Pestana (MG). Foi, por sinal, de um deputado tucano que veio a ser senador, Antero de Barros, a emenda que resultou no artigo 55. O texto quis deixar claro que o mandato derivado do voto só pode ser cassado pelo poder com origem popular, embora determine a cassação de parlamentares condenados pela Justiça. Por fina ironia do tempo, na tarde de quinta-feira, enquanto Oscar Niemeyer era velado no Planalto, a Câmara devolvia simbolicamente os mandatos dos cassados pela ditadura e o STF antecipava sua disposição. Marco Maia, solitariamente, repetia: “Já fui claro. Se isso ocorrer, não acatarei, ficarei com a Constituição”. Vão cassá-lo por desobediência à Justiça?
O gênio e a curva
Tanto foi dito sobre Niemeyer, tanto ainda se dirá, agora que é eterno. Mas ainda há tempo para um poema. “O poema da curva”: “Não é o ângulo reto que me atrai/nem a linha reta, dura, inflexível, criada pelo homem/O que me atrai é a curva livre e sensual/a curva que encontro nas montanhas do meu país/no curso sinuoso dos seus rios/nas ondas do mar/no corpo da mulher preferida. De curvas é feito todo o universo/o universo curvo de Einstein”
Conflitos federativos
A questão das tarifas de energia virou angu, com o PT acusando os tucanos de não terem permitido a redução de 20% com a não adesão das geradoras de estados que governam. Estes retrucam que a presidente Dilma Rousseff descumpre a promessa, cometendo estelionato eleitoral. Governadores guerreiam por causa do veto parcial à lei dos royalties. E ainda falta a regulamentação da partilha dos recursos do Fundo de Participação dos Estados (FPE). Dilma perdeu uma chance de ter juntado todas essas questões numa pactuação federativa com os estados.
Os russos
A presidente Dilma viaja hoje para a Rússia, levando na comitiva mais de 200 empresários. O Brasil tem muito o que negociar com os russos. E precisa reavivar a mística dos Brics, que a crise internacional obscureceu.
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