domingo, 28 de abril de 2013

AFFONSO ROMANO DE SANT'ANNA » O panóptico de Boston‏


Estado de Minas: 28/04/2013 


Qual a relação entre o que ocorreu em torno da Maratona de Boston este mês e o panóptico concebido pelo filósofo Jeremy Bentham (1748-1832) e seu irmão engenheiro Samuel (1757-1831)?

Qual a relação entre o fato de o governo americano ter vasculhado todos os filmes de câmeras de segurança e também os filmes particulares para encontrar (rapidamente) os responsáveis pelo atentado e a sociedade pós-moderna, em que público e privado se misturam?

Vamos por partes.

Os irmãos Jeremy e Samuel, preocupados com o sistema de vigilância dos criminosos, bolaram um tipo de presídio que permitia que o indivíduo confinado fosse vigiado durante 24 horas por dia. Não havia escapatória. Era uma estrutura circular. De um ponto determinado, o vigia sabia tudo o que os presos estavam fazendo. Era uma maneira total, totalitária, de controle do que ocorria na prisão.

Isso era, em parte, uma novidade. Sobretudo nas prisões. Mas esse controle já existia, de forma mais amena, na arquitetura dos internatos, dos colégios de padres e quartéis, e até na disposição das casas, nas pequena vilas. Todos se vigiando angustiante e gostosamente. E recentemente criamos uma inversão do panóptico dos irmãos Bentham. Das prisões brasileiras os presos descobriram modos de aprisionar os que estavam livres. Inventaram, pelos celulares, formas de sequestros, extorsão, atentados, etc.

Jeremy e Samuel se espantariam com essa reversão da expectativa.

Mas estou falando de Boston e do atentado perpetrado pelos dois tenebrosos desmiolados, que de tão inconsequentes e amadores, não tinham sequer pensado em planos de fuga. E naquela cidade o sistema de vigilância, ao contrário do primarismo dos criminosos, nos deu prova de sua devastadora competência. Graças a esse infausto episódio ficamos sabendo que existem helicópteros capazes de filmar/fotografar figuras a partir do calor que emitem. Dizem que foi assim que registraram o terrorista deitado, escondido num barco.

Os dois criminosos com mentalidade de anarquistas do século 19 não se deram conta das características da sociedade em que viviam. Achavam que podiam largar suas mochilas com as bombas aqui ou ali. E que por estarem no meio da multidão seriam invisíveis.

Equivocaram-se. A multidão não é mais sinônimo de anonimato. O mundo vive aprisionado num panóptico. Quando estive a última vez em Londres, alguém apontou as câmeras em todos os lugares e disse que qualquer cidadão era filmado centenas de vezes por dia. Não é só Londres ou Boston, até em Volta Redonda existe esse sistema.

Vejam os aeroportos onde nos impingem o “strip-tease” cívico. Vejam a entrada de qualquer prédio público ou privado nos pedindo identidade. Sorria, você está sendo filmado! Vejam a espionagem de nossos telefones e pela internet. Vejam os satélites vasculhando tudo lá das alturas. E quando o nefando Bush decretou o “patriotic act” o sistema americano sabia até que livros você tinha tirado nas bibliotecas. E, como alguns sabem, as editoras anotam por meio de dispositivos nos iPads quais os trechos dos livros assinalamos como os mais interessantes.

Portanto, nem o terrorismo admite mais os amadores.

George Orwell e seu realista Big Brother sempre são citados. O comunismo e o nazismo exerciam atroz vigilância sobre os cidadãos. A democracia, para se defender e para atacar, acabou gerando métodos de vigilância que têm sinal ambíguo, duplo, tanto negativo quanto positivo.

Isto aqui é uma crônica, não um ensaio. Mas se eu me chamasse Zigmund Bauman ou fosse filósofo francês, escreveria um livro chamado Tecnologia: liberdade e repressão. Que assunto fabuloso! Os dois lados da questão. O bem e o mal juntos. Deus e o diabo na neve e no sol. Olhar as coisas por vários ângulos, estudar o panóptico pelo ângulo do oprimido e do opressor.

Sorriam! Não farei isso. Sou apenas um poeta; segundo alguns, vivo nas nuvens.

Nuvens que estão prenhes de dados da informática…

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Um comentário:

  1. Afonso Romano, existe uma teoria de que foi uma armação do Governo americano. Inclusive com uma foto de um ex veterano de guerra, que perdeu a pena em uma guerra e foi ator de uma da fotos onde parece sendo socorrido com a perna destroçada. Viu algo na rede sobre isto? Procure e veja que, como em 1984, o poder tambem manipula a imagem.

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