ZERO HORA - 28/04/2013
Dois
anos atrás tive o prazer de ser entrevistada pelo chef Claude
Troisgros, e lembro de que o encontro foi divertido e ao mesmo tempo
inusitado pra mim, já que minha relação com as caçarolas sempre foi de
intimidade zero.
Pois agora recebi o convite da incrível Neka
Menna Barreto para uma entrevista para a tevê que também ocorreria
durante o preparativo de alguns quitutes. Minha intimidade com as
caçarolas segue a mesma, porém sou amiga da família da Neka há muitos
anos, todos gaúchos. Só que meu contato com ela, por ser moradora de São
Paulo, era mais restrito. Finalmente, equalizamos essa distância da
melhor forma possível: com um bom papo na cozinha.
Quanto mais
me aproximo desse universo que desconheço, mais me dou conta do quanto
perco por não saber cozinhar. Conversando com a Neka, percebi a
filosofia envolvida no processo – ao menos no processo dela, que usa sua
colher de pau como uma espécie de varinha de condão, transformando em
mágica cada receita aparentemente prosaica.
Neka é uma chef que
escolheu a vida como principal ingrediente – não a industrializada, mas a
vida em sua origem, em sua raiz. Seu talento está não apenas na
criteriosa escolha dos ingredientes, mas na maneira de pensar sobre o
que está fazendo e de explorar todas as sensações envolvidas.
Ela
perfuma a cozinha com infusões de hortelã, “acorda” as sementes,
encontra conexões entre rusticidade e sabor – de tudo Neka extrai um
conceito. Cada alimento traz em si um benefício para a memória, para o
humor, para a concentração. Ralar uma noz moscada nos ensina a
reconhecer limites.
Triturar um bastão de canela fortalece o
bíceps. Dissecar uma vagem seca de baunilha (eu nem sabia que a baunilha
vinha de uma orquídea) desperta a sensualidade – se você tem acesso à
Neka, peça para ela contar os efeitos de esconder um galhinho de
baunilha dentro do sutiã. Segundo ela, a mulher para instantaneamente de
falar sobre si mesma e, silenciosa, passa a ser quem é. Viajandona?
Pode ser, mas descobri com ela que o tempero que faz viajar é outro.
Para
quem só se interessa pelo concreto da vida, nada disso faz o menor
sentido, porém é justamente sobre sentidos que está se falando aqui. Do
amor que há em manusear tâmaras e nozes picadas, da energia que as ervas
emanam, da estupidez de se consumir velozmente um prato ultracalórico e
depois passar uma tarde inteira digerindo-o. “Gastamos muito tempo com
digestão, quando poderíamos estar caminhando mais, dançando, flanando,
vivendo até os cem anos com leveza”.
Neka é uma alquimista de
personalidade única. Tudo nela é inspirador, desde seus turbantes
coloridos até seus pontos de vista. “Estamos nos acostumando com
soluções instantâneas, enviando e-mails que chegam a Tóquio em um
segundo, comprando comida pronta. Ninguém mais prepara, ninguém mais
espera. Se vejo alguém muito agitado, correndo atrás do relógio,
recomendo: cozinhe e recupere a noção do tempo real”.
Não
bastasse a delícia de suas criações gastronômicas, a querida Nekinha
também é craque em dar receitas para nossas almas desnutridas.
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