Marieta Severo confessa que não se
apega aos papéis que faz, deixa as personagens para trás e segue.
Sucesso na TV e nos palcos, atriz se prepara para estrear comédia Vendo
ou alugo
Walter Sebastião
Estado de Minas: 07/04/2013
Quando se diz o nome Carlota Joaquina de Bourbon, da arrogante mulher
de dom João VI, ele puxa, na memória, uma face: a de Marieta Severo, no
filme A princesa do Brasil (1995), de Carla Camurati. A atriz, avessa a
nostalgia, reconhece que foi momento especial da carreira. “Tenho
orgulho de ter feito o filme ao lado de Marco Nanini. Mas os méritos são
da diretora”, observa. “Carla venceu todas as adversidades. É um
exemplo da capacidade do brasileiro de transformar dificuldades em
criatividade”, garante, satisfeita pelo fato de o longa ser apontado,
ainda hoje, como início do encontro entre público e cinema nacional.
Marieta
Severo estará até maio, de volta às telas de cinema com Vendo ou alugo,
de Betse de Paula. É a história de bisavó, mãe e filha, que, depois de
viver sem se preocupar com nada, têm de vender a casa para pagar
dívidas.
É o 38º longa da atriz, em carreira iniciada em 1965.
Que começou na tela grande, com o teatro e antes da televisão – a
primeira das 22 novelas é de 1966, foi O sheik de Agadir. “Foi ótimo ter
feito os filmes, queria estar nos projetos, mas, em alguns deles,
apenas estou no filme. Personagens expressivos não foram tantos assim”,
observa. “Com o tempo, fui ficando mais seletiva”, conta.
“O
cinema fez parte da minha formação cultural. Sou de uma geração cuja
cabeça foi feita pelo cinema”, afirma Marieta Severo. Criança, ela
adorava as chanchadas. A escola era na mesma rua onde funcionava famoso
cinema de arte do Rio de Janeiro (o Paisandu) e a atriz matou aulas para
ir a sessões. Foi barrada, por não ter a idade exigida, ao tentar ver A
fonte da donzela, de Ingmar Bergman. Adolescente, viu, e ficou
impressionada, com Deus e diabo na terra do sol, de Glauber Rocha, e
Vidas secas, de Nelson Pereira dos Santos. Jovem, curtiu filmes de
diretores cultuados, como Fellini, Luiz Bunuel, Lucchino Visconti e
Antonioni, entre outros.
Valor cultural
“Fui
formada pelo Cinema Novo”, afirma Marieta Severo. Eram filmes, ela
recorda, que traziam um Brasil distante, com contundência e de modo
artisticamente forte. “Havia a luta para estabelecer o cinema brasileiro
entre o público, como um valor cultural e para criar um indústria
cinematográfica. Não era utopia, porque os diretores criaram filmografia
consistente”, observa, apontando aspecto que fortalecia o projeto.
“Tinha admiração profunda pela inteligência, criatividade e batalha dos
diretores. Era idealismo não só no sentido de fazer o melhor cinema, mas
também de ter olhar atento para o país”, explica.
O encanto com
o Cinema Novo responde por dor de cotovelo que Marieta Severo não
esquece: convidada pelo diretor Joaquim Pedro para fazer Macunaíma, não
aceitou porque tinha outros compromissos. Se arrepende até hoje. “O bom é
hoje, antes havia ditadura”, afirma, lembrando que viver no Brasil dos
anos 1970 não foi fácil. Não se esquece, ainda, do confisco da poupança,
no governo Collor, no início dos anos 1990. “Fez com que a produção de
100 filmes ao ano caísse para um”. Não tem saudades dos personagens que
interpretou. “ Não sou eu. Tomo distância e deixo para trás”, conta.
Muitas ideias
“Como
atriz e espectadora vejo com muita atenção a produção contemporânea, os
jovens realizadores. É um pessoal cheio de ideias que vem alimentando o
cinema brasileiro”, observa Marieta. “Eles têm feito filmes que serão
fundamentais para uma história do cinema brasileiro ainda a ser
escrita”, defende a atriz.
Um exemplo, aponta, é O som ao redor,
de Kleber Mendonça. A atriz adora cinema, mas não pensa em dirigir
filmes. “É complicação enorme. Teatro já é uma loucura”, afirma. O
próximo projeto é volta aos palcos com a peça Incêndios, do libanês
Wajdi Moua Wad.
Três perguntas para...
Marieta Severo
atriz
Você pode falar de Vendo ou alugo, seu novo filme?
Ainda
não vi o filme. Gosto de assistir com o público. O que estou adorando é
ser comédia politicamente incorreta, com personagens irresponsáveis,
mais ou menos da minha geração, gente que buscou os prazeres da vida sem
se preocupar com mais nada. Me atraiu muito. É bom provocar, mexer um
pouco com as coisas, criar marolas. É muito divertido.
Você pode falar como é o cinema para o ator?
Um
bom roteiro já é possibilidade enorme de bom filme. Mas até o último
corte tem surpresas. Às vezes, você pensa: acertei. E na edição picotam
de tal jeito, não colocam uma piada no timing certo, e acabam com tudo o
que você fez. O único lugar em que o ator é soberano é no teatro. Como
no cinema ninguém faz nada sozinho, você está sempre está na dependência
de outras pessoas. Claro que se ganho um belo close, bem iluminado, com
bom ângulo, traz vaidade, tem o seu valor, mas não é o objetivo. Uma
atuação que você não considera boa, por outro lado, é motivo de dor
grande, você sai do cinema machucado. Pode-se, ainda, estar enorme na
tela de cinema, mas fazendo algo fraco, ruim, e estar na tela “pequena”
da TV com força e em papel expressivo.
Como você vê o cinema brasileiro hoje?
Artisticamente,
que é o mais importante, temos filmes para todos os públicos. E temos
de respeitar todas as opções, porque é assim que se cria elo sólido do
público com o cinema do Brasil. Há roteiros interessantes, com histórias
boas e bem contadas. Houve apuro, conquistas técnicas, produto de
trabalho grande e bem-sucedido, para ganhar a confiança do público.
Hoje, já se escolhe ver um filme por ser produção nacional. Tínhamos, em
outros tempos, problemas como o som ruim, que trazia preconceito com a
nossa produção. Minhas filhas discutiam comigo e diziam que eu só tinha
gostado de um certo filme por ser brasileiro. E realmente minha torcida
para que tudo desse certo era muito grande. Um problema é as produções
não terem a distribuição que merecem.
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