Das três toalhas imensas, daquelas que enrolam o philosopho por inteiro depois do banho, não restou nenhuma
Eduardo Almeida Reis
Estado de Minas: 27/04/2013
Obram muitíssimo
bem todos os que pensam melhorar as condições das empregadas domésticas.
O salário de uma boa doméstica, dedicada, eficiente, amiga do patrão,
não pode ser avaliado pelas normas das outras categorias profissionais.
Claro que ela, doméstica, quando amiga, eficiente e dedicada, contribui
para os ganhos do patrão. Morando 16 anos na capital de todos os
mineiros, tive uma coleção de porcarias trabalhando para mim, como
também tive bela morena, educada, inteligente, dedicada, casada,
cheirosa (pormenor importantíssimo), que me serviu durante cinco anos:
até hoje é minha amiga e telefona para saber notícias do philosopho.
Logo
que cheguei a BH contratei moça de 26 aninhos, mãe de três filhinhos de
pais diferentes, muito bonita, cheirosa, recomendada por agência de
empregos. Nas idas ao supermercado, acompanhado pela jovem, despertei a
inveja de todos os cavalheiros sérios que encontrei entre as gôndolas.
Devo confessar, por amor da verdade, que andei pensando bobagem: todo
cavalheiro honesto pensaria, mas algum ser superior salvou o ateu da
enrascada. Trabalhou seis meses lá no apê, vizinho da Favela do Cafezal,
e roubou tudo que podia roubar, com o seguinte detalhe: boba que era,
levava lençóis e uma fronha de um jogo, mas deixava uma fronha que não
fazia par com os outros lençóis. Das três toalhas imensas, daquelas que
enrolam o philosopho por inteiro depois do banho, não restou nenhuma.
Teria sido a coisa mais fácil do mundo mandar a polícia à casa da jovem
bonita e cheirosa, que morava na divisa de Contagem com BH. Fiquei sem
as toalhas, os lençóis e o mais que a mineira furtou, comprei tudo novo,
mas até hoje não encontrei toalhas iguais às que comprei no Rio.
Depois
dela, foi uma sucessão de domésticas ruins ou péssimas, até conhecer a
bela morena que ficou cinco anos, hoje tem salão de beleza, tem boa casa
e está construindo outra. Seu marido é inteligente e trabalhador. O
casal vai longe. Na lista das ruins ou péssimas, fatos curiosos. Minha
bela e inteligente companheira, tendo espaço na despensa, comprava logo
uma dúzia de litros de óleo de milho. Num determinado dia, comprou os 12
litros, que mandou guardar na despensa; dia seguinte havia cinco. Fazer
o quê? Chamar a polícia? Esquece. É melhor despedir, desejando muita
felicidade à operadora de subtração do alheio. Alfim e ao cabo estamos
no Brasil, país tropical, abençoado por Deus e bonito por natureza, onde
sete litros de óleo de milho a gente pode comprar na esquina e deixar
como está para ver como é que fica.
Fatos
Domingo
de Páscoa, São Paulo (SP). Concerto no Ibirapuera, entrada grátis,
orquestra e coro do Teatro Municipal, regência do maestro John
Neschling. Havia mais gente no palco, entre músicos e cantores, do que
na assistência de seis gatos pingados. No mesmo dia, o festival
Lollapalooza, mesma cidade, ingressos caros: centenas de milhares de
assistentes em êxtase. Dia seguinte, 1º de abril, Minas Gerais.
Aniversário de 50 anos de um cavalheiro, jantar no seu sítio, 40 casais
regulando em idade com o aniversariante, meia dúzia de jovens, quatro ou
cinco crianças. Som numa altura que dava para ouvir no município
vizinho. Por quê? Ninguém sabia explicar, mas tocou naquela altura até
terminar a festa. Crianças e jovens tinham aulas na manhã seguinte.
Concomitantemente, publiquei uma crônica no Correio Braziliense dizendo
que detesto música sertaneja, apesar de ter vivido muitos anos na roça
ou talvez por causa disso. Direito meu. Gosto de tango, bolero, samba,
música clássica, ópera e fujo dos sertanejos como o diabo da cruz.
Leitor educado protestou dizendo que é “a música do brasileiro” e seu
pai, goiano, passou a vida tirando leite de vaca, tendo como única uma
alegria existencial Tonico e Tinoco no rádio e na vitrola. Também ouvi a
dupla, mas forçado, porque era tocada numa empresa rural em que
trabalhei. Fronteira com o Paraguai, os empregados também curtiam as
polcas paraguaias, baladas de andamento lento, quase sempre em tom
menor, chamadas guarânias. Do lado de cá da fronteira atendiam pelo nome
de porcas paraguaias. Polca ou porca, tanto faz: um pavor!
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