Imprevisibilidade econômica é maior problema do país
Um dos conselheiros mais influentes do Brasil, ex-BRF admite mágoa no processo de saída da empresa
Secches deixou ontem a presidência do conselho de administração da BRF (companhia resultante da fusão entre Sadia e Perdigão), mas permanece no conselho de cinco empresas líderes nos setores em que atuam --do financeiro ao industrial. "É uma forma de ter uma visão da economia como um todo."
Com base nesse trânsito e na experiência --Secches comandou a BRF durante 18 anos, após outros 18 anos no BNDES--, ele diz que as empresas precisam de estabilidade nas variáveis macroeconômicas para investir.
Em entrevista exclusiva no primeiro dia desligado da BRF, admitiu mágoa no processo que resultou na saída da empresa --ele soube da insatisfação dos fundos sobre a sua gestão pela imprensa.
"A pessoa não teve a hombridade de me falar pessoalmente. Isso me magoou."
Folha - Qual é o principal problema das empresas brasileiras atualmente?
Nildemar Secches - A economia como um todo está perdendo competitividade, e isso é resultado de uma combinação de várias coisas. Mas o Brasil precisa, mais do que tudo, de regras relativamente estáveis. A indústria, para ser eficiente, precisa antes de mais nada de horizonte.
O empresário faz ganhos de produtividade de curto prazo, mas eles são sempre marginais. Os grandes ganhos de eficiência se fazem no longo prazo. Eu vejo muitas coisas sendo feitas (para estimular a economia) e todo mundo reclama que não dá resultado.
Elas terão algum efeito?
Vão produzir efeitos no longo prazo se ficarem estáveis e de uma forma ordenada para que o empresário tenha condição de ter uma previsibilidade, para incorporar isso no seu planejamento. Você pode ter ganhos específicos setoriais de curto prazo, mas, para a economia como um todo, são pouco relevantes.
Onde falta previsibilidade?
Tem quatro grandes variáveis macroeconômicas --juros, câmbio, salário e tributos-- nas quais você precisa ter previsibilidade. As mudanças na desoneração da folha são superbem-vindas. Agora, causa insegurança você ter uma parte da economia num sistema e parte em outro.
Esse ambiente afasta os investidores das empresas?
Sim, o humor dos investidores estrangeiros azedou. E, quando começa a ter algum tipo de restrição dos investidores, os empresários também se perguntam: vou entrar nisso sozinho? Eles se retraem.
O que as empresas fizeram uma boa parte da vida delas está baseado no espírito de confiança do brasileiro. Ele confiava que tudo ia dar certo e ia fazendo. Só que as empresas foram adquirindo dimensões tão grandes que hoje, no "feeling", é muito difícil. As empresas têm dimensões internacionais.
Há maior preocupação com o grau intervencionista do governo na economia?
Dos investidores estrangeiros sim, sem dúvida. Dos investidores nacionais, há nos setores que estão mais ligados a regulação, concessões. Nos segmentos mais concorrenciais, eu diria que não há essa preocupação.
A inflação preocupa mais?
No meu ponto de vista, a inflação não joga o principal papel nesse processo. É importante, mas ela dá um tom de curto prazo para um problema de longo prazo, que é a estruturação da economia.
Como é deixar a BRF após 18 anos à frente dela?
Tem a sensação de perda de uma relação que foi muito boa. Obtivemos sucesso todos juntos. Éramos um grupo muito unido. Somos, não é? Esperamos continuar sendo.
Mas isso foi preparado. Decidi sair agora porque a companhia, nos dois últimos anos, adquiriu características que de certa forma estavam conflitando, querendo rediscutir muitos assuntos, estratégias... Achei que minha saída facilitaria o processo.
A data foi definida no fim do ano passado?
Sim, em dezembro já havia conversado com a Previ. Depois ocorreram todos aqueles fatos que deram uma sensação um pouco ruim desse processo, que era para ter sido absolutamente normal.
A mudança, então, não ocorreu porque havia acionistas incomodados com o retorno?
Isso é o que me incomodou um pouco, porque eu fiquei sabendo pelos jornais. Apareceram coisas estranhas, questionamentos de que a empresa não está com dinamismo de crescimento.
Ora, a empresa cresceu 26% ao ano, 18 anos seguidos. Mas eu não posso nem fazer uma crítica aberta, porque não me foi feita uma crítica diretamente.
Esse desfecho o magoou?
Sim. Não precisava ser feito dessa forma. A pessoa não teve a hombridade de falar pessoalmente, isso me magoou. Ponto. Mais nada. Não tenho nada contra o Abilio (Diniz, eleito anteontem presidente do conselho da BRF).
O sr. vê conflito de interesses no fato de Abilio acumular a presidência dos conselhos da BRf e do Pão de Açúcar?
Não vou opinar. Os acionistas são soberanos para decidir sobre isso e eles já decidiram.
Leia a íntegra
folha.com/no1260642
RAIO-X - NILDEMAR SECCHES
IDADE
64 anos
64 anos
FORMAÇÃO
Engenheiro, com pós-graduação em finanças e doutorado em economia
Engenheiro, com pós-graduação em finanças e doutorado em economia
CURRÍCULO
Membro dos conselhos de administração do Itaú, Weg, Suzano, Ultrapar e Iochpe-Maxion; foi presidente da Perdigão de 1995 a 2008 e, após fusão da empresa com a Sadia, assumiu a presidência do conselho de administração da BRF, função que deixou anteontem
Membro dos conselhos de administração do Itaú, Weg, Suzano, Ultrapar e Iochpe-Maxion; foi presidente da Perdigão de 1995 a 2008 e, após fusão da empresa com a Sadia, assumiu a presidência do conselho de administração da BRF, função que deixou anteontem
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