Norueguês Karl Ove Knausgard, que vem para a Flip, causou escândalo e encantou crítica com "Minha Luta"
Sua autobiografia romanceada em seis volumes fez com que ele fosse ameaçado de processo por familiares
Isso já seria incomum o suficiente se levássemos em conta que Knausgard (pronuncia-se "quenausgorde") era, àquela altura, muito mais um autor elogiado pela crítica do que frequentador das listas de mais vendidos.
Mas muito mais estranho que isso é saber que o tal projeto, que acabou por vender 500 mil exemplares --num país de 5 milhões de habitantes--, tratava-se de uma caudalosa autobiografia romanceada de 3.500 páginas em seis volumes, à moda de "Em Busca do Tempo Perdido", do francês Marcel Proust.
A razão do sucesso de público, é claro, foi muito mais o fator "big brotheriano" que a qualidade da narrativa, esta reconhecida por críticos celebrados como James Wood, autor de "Como Funciona a Ficção" (Cosac Naify).
A questão foi que, nos seis volumes de "Minha Luta", Knausgard não poupou ninguém que conhecesse. Nem mesmo (ou principalmente) seu pai, morto em 1998, vítima do alcoolismo, e a avó paterna, cuja demência senil e incontinência urinária nos últimos anos de vida ele descreve com riqueza de detalhes.
CONCESSÕES
"A Morte do Pai", o primeiro dos seis livros, que chega em breve às livrarias do país pela Companhia das Letras, fez com que metade da família de Knausgard tentasse impedir a publicação da obra e cortasse relações com ele.O autor, confirmado no time internacional que participa da próxima Festa Literária Internacional de Paraty, em julho, fez só algumas poucas concessões --trocou nomes de familiares e cortou uma cena do segundo livro que incomodara sua mulher.
Mostra-se dividido sobre como lida com as consequências do projeto do qual mais se orgulha literariamente. Mas diz que ninguém poderia lhe tirar o direito de contar uma história que era sua.
"Tive a chance de não ir em frente, já que minha família conheceu o conteúdo antes. Publicar o livro seria como dizer a eles minha literatura é mais importante que suas vidas', o que não é certo. Por outro lado, quem teria o direito de me impedir de escrever sobre minha relação com o meu pai?", argumenta.
RELAÇÃO
O pai de Knausgard morreu em 1998, no verão em que o autor publicava seu primeiro e elogiado romance, "Ute av Verden" (Fora do Mundo).As lembranças turbulentas que tinha da relação com o pai logo o fizeram perceber que a história que queria contar num livro, na realidade, era sua história com o pai, figura enigmática cujo declínio ele acompanhou aos poucos, enquanto se preocupava mais com típicos dilemas juvenis, como a descoberta da maturidade sexual.
Mas foi só quando completou 40 anos, idade com que o pai morreu, que Knausgard se sentiu confiante para escrever. "Eu me senti mais identificado com ele. Já era pai e tinha atribulações como ele. Mas, em vez de me destruir com o alcoolismo, como ele fez, usei a literatura"
O fato é que ninguém pode acusar Karl Ove Knausgard de não gostar de uma polêmica. Não bastasse a abordagem dos livros, resolveu batizar o conjunto com o nome nada inocente de "Minha Luta", título que remete às memórias de Adolf Hitler.
"O título tem a ver com a vida de todo mundo, viver é uma luta. Mas é claro que foi uma provocação. Meu editor não queria aceitar de jeito nenhum, mas bati o pé", diz.
Mas a provocação dentro dos livros era tanta que até que não pegaram no pé dele por causa disso.
RAIO X - KARL OVE KNAUSGARD
Nasceu em Oslo, na Noruega, em 6 de dezembro de 1968
FORMAÇÃO
História da arte e literatura na Universidade de Bergen
CARREIRA
Estreou com "Ute av Verten" (1998); virou best-seller com "Minha Luta" (2009-2011)
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