Amigo torcedor, amigo secador, eis que o corvo Edgar, meu estimado animal agourento, renasce das cinzas nesta semana. Uma semana, digamos assim, perfeita. Perfeita para quem seca. Porque torcer não tem graça, é a obviedade máxima, quase um voto de castidade perante um clube.
Perderam, pela ordem da empáfia ludopédica, Real Madrid, Barcelona, Corinthians, São Paulo, Fluminense. Chupa que é sabor --artificial-- de chucrute.
Lindo. Foi a glória, crocita el cuervo, que torce, estranhamente, pelo time do Papa, o San Lorenzo. Foi a glória para o penoso, mesmo considerando o triunfo do Boca, um time que existe, no momento, apenas no inconsciente perdedor do viralatismo brasileiro.
Ah, não esqueçamos, é o Boca, portanto devemos o afeto que se encerra na derrota. Se eu fosse técnico ou mulher de boleiro, jamais deixaria esses caras assistirem às mesas redondas. Fosse eu parente, cunhado, digamos, proibiria boleiro de testemunhar essas verdades meia-boca da crônica esportiva.
Porque eles ouvirão, dos mestres da bola, que o Boca é o Boca. Aí é que está a moral do jogo. Os times lanternas do Campeonato Argentino não ouvem tal maldita verdade, portanto, crianças, os lanternas do Campeonato Argentino, sejamos didáticos, vencem o Boca. Fácil, não?
É como mentalizar uma fábula. A do chapeuzinho vermelho, por exemplo. O Corinthians foi à Argentina com um cestinho de ofertas. Impressionante o respeito na hora errada. Não vai, Corinthians, vem para a realidade que tu ganhas muito mais.
Ah, o Boca! O Boca um cacete. Por que qualquer um passa por cima deles lá na Argentina e mantemos esse tapete vermelho moral para recebê-los? Poxa, seu Tite, és um sábio, um grande homem mesmo, sensato, correto, te admiro, que ajustes o psicológico dos meninos.
O corvo Edgar, porém, o maior secador do país, só festeja. Quando, em apenas uma semana, o então imbatível Timão volta a pagar pau para argentino? Quando, pergunto, o Fluminense despenca do mesmo jeito? E o São Paulo, quem diria, ruminando o humilde capinzim mineiro no canto do beiço. "Galo", grita o corvo.
Edgar, o bicho, reflete, diante do estadão das coisas: o Brasil vai acabar ganhando essa Copa-14. É o que conclui, aqui no ombro em uma viagem amazônica.
Faz todo o sentido. Com a palavra, digo, o bico, de novo o corvo: "A seleção brasileira perderia hoje até o Campeonato Amazonense, mas tem tudo para ganhar o Mundial, são apenas sete jogos. Perde uma, empata outras e chega".
O Brasil perderia qualquer campeonato sério do planeta. A Copa do Mundo, porém, é a única coisa possível. É bem provável que o Brasil ganhe no próximo ano. Copa do Mundo nunca refletiu direito o futiba que se joga no momento.
Xico Sá, jornalista e escritor, com humor e prosa, faz a coluna para quem "torce". É autor de "Modos de Macho & Modinhas de Fêmea" e "Chabadabadá - Aventuras e Desventuras do Macho Perdido e da Fêmea que se Acha", entre outros livros. Na Folha, foi repórter especial. Na TV, participa dos programas "Cartão Verde" (Cultura) e "Saia Justa" (GNT). Mantém blog e escreve às sextas, a cada quatro semanas, na versão impressa de "Esporte".
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