Se Dilma fosse japonesa
Brasil e Japão adotam políticas parecidas, mas na mídia só brilha uma. Adivinhe qual delas
Quem você imagina, então, que aparece na capa da revista "The Economist", com direito à roupa de super-herói/heroína? Se respondeu Dilma Rousseff, errou feio. É Shinzo Abe, primeiro-ministro japonês faz quase cinco meses.
Não é só na "Economist" que a pobre Dilma perde para Abe. Na própria Folha, o crescimento japonês ganhou manchete de página no caderno "Mundo", mas o do Brasil não mereceu idêntico privilégio no caderno "Mercado".
Até entenderia o tratamento mais rico para quem cresceu menos se, por acaso, Dilma e Abe praticassem políticas econômicas muito diferentes, ele pró-mercado, como gosta a grande maioria da mídia nacional e internacional, e ela fosse uma espécie de Hugo Chávez de saias.
Mas não é assim. Com as inevitáveis diferenças decorrentes das respectivas histórias e tamanho da economia, vale para Dilma o que a "Economist" diz da "Abenomics", como está sendo chamado o modelo do novo premiê japonês: é "um misto de reinflação, de gasto do governo e de uma estratégia de crescimento desenhada para chacoalhar a economia de um estado de animação suspensa que a sufocou por mais de duas décadas" e que pretende "tornar o governo vigoroso de novo".
(Usei o neologismo reinflação em lugar de "reflation", em inglês, para deixar claro que se trata de reverter a deflação que o Japão enfrenta há muito tempo e que, de resto, a "Abenomics" ainda não conseguiu desmanchar. O índice de preços ao consumidor mostrou queda de 0,9% em março, o décimo mês consecutivo de deflação.)
O texto da "Economist" soa a elogio, a ponto de dizer que Abe "eletrizou uma nação que havia perdido a fé na sua classe política".
Para Dilma, ao contrário, a revista britânica reservou há pouco um necrológio, ao definir como "moribunda" a economia brasileira.
Não só a "Economist", mas nove de cada dez analistas que habitualmente frequentam as páginas dos jornais não acham que Dilma eletrize alguma coisa; ao contrário, em vez de eletrizante, ela é retratada como insuportável intervencionista.
Não estou dizendo que as políticas de Dilma devam ser elogiadas ou que não tenham defeitos. O que não me parece lógico é tratar como tamanha diferença de enfoque políticas que têm um razoável parentesco -e resultados idem.
Até porque a opinião pública, no Japão como no Brasil, trata igualmente seus respectivos governantes. Abe, lembra a "Economist", tem 70% de aprovação. Dilma, lembra o Datafolha, está com 64%, o mais alto índice desde que tomou posse há dois anos e cinco meses.
Pode ser que, mais lá na frente, a diferença de tratamento se justifique, sabe-se lá. Mas, por enquanto, faz lembrar, com sinal trocado, antiga propaganda de um produto japonês fabricado no Brasil que dizia algo como "nossos japoneses são mais criativos que os outros".
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