Flávia Ayer
Estado de Minas: 05/05/2013
Aos
63 anos, muita gente sonha ter uma aposentadoria sossegada, com casa
própria e rotina tranquila. Nessa idade, com sete filhos criados, o
mineiro Aladir Murta se desfez de imóveis e pertences para encontrar sua
verdadeira vocação. Numa canoa de madeira, seguiu pelo Rio Araguaia,
chegou à Ilha do Bananal e não parou mais. Brasil afora alcançou o
Solimões, Negro, Amazonas, São Francisco, Velhas e tantos outros até
atingir 60 mil quilômetros percorridos. Em 13 anos de expedições, ele
completa 76 anos, sendo considerado o maior navegador solitário do mundo
por revistas especializadas.
Nascido num encontro de rios em Itira, distrito de Araçuaí, e criado em Coronel Murta, cidades do Vale do Jequitinhonha, Aladir acaba de voltar às origens e concluir a travessia “mais difícil e bonita que existe”. Em três meses, remou em sua canoa – agora de fibra de vidro – por mais de 1 mil quilômetros no Rio Jequitinhonha, de Medanha, distrito de Diamantina, até a foz, em Belmonte, na Bahia. Emocionado depois do reencontro com o curso d’água de sua infância, Aladir veio a Santa Luzia, na região metropolitana, visitar a mãe, de 104 anos, e conversou com o Estado de Minas sobre as aventuras a bordo. A próxima investida será percorrer novamente o Velho Chico, da Serra da Canastra à foz.
Antes de ser navegador, Aladir foi cabo do Exército e lapidário de pedras preciosas, trabalhou também numa pequena indústria e cruzou o país numa moto. Mas importante para ele foi a história que começou a escrever em 14 de setembro de 2000. “Lia muito sobre o Rio Araguaia e tinha muita vontade de conhecê-lo. Lá, descobri que se navegasse um quilômetro, navegaria dois até chegar a 60 mil”, conta o navegador, que se tornou presidente da Associação de Proteção do Rio Araguaia e da Ilha do Bananal.
Desde o início da aventura, Aladir não tem residência fixa e o celular vive fora de área. “Quem quiser me encontrar, é só ir a um rio”, diz. Na embarcação guarda tudo que precisa: barraca, colchão inflável, rede, duas panelas, duas varas de pescar, um fogareiro, um facão e alguns mantimentos em garrafas PET. Num outro compartimento, duas calças, duas bermudas e duas blusas. Os documentos vão num tambor, para não correr o risco de molhar – o suficiente para sobreviver entre as margens dos rios, onde histórias fantásticas e lendas se fundem.
Homem de fala lenta e palavras simples, Aladir parece até conversar num outro idioma quando começa a contar dos trajetos dos rios e nomes de tribos. No Araguaia, passou dias atracado, cuidando de uma onça ferida. Num outro episódio, próximo a Aripuanã, em Mato Grosso, ele viu um ritual de canibalismo. Também já se deparou com jacaré de sete metros na Amazônia e tomou uma capivara da boca de uma sucuri. “É nesse lugar que tem a cobra grande, de mais 20 metros”, conta. Mas essa seu Aladir não viu. “Só que eu vi quem viu a cobra”, diz o navegador, mostrando sabedoria.
PELAS ÁGUAS A remo, cruzou fronteiras com Peru, Colômbia e Paraguai, superou quedas d’água de 10 metros de altura, navegou o São Francisco e o Velhas três vezes cada um e, nessas viagens, passou por alguns apuros. Já naufragou, enfrentou tempestades, comeu peixe cru por uma semana, foi assaltado cinco vezes e, sem outra opção, teve que beber água do poluído Rio das Velhas. “Foi lá em Santana do Pirapama. Passei a mão como se estivesse limpando e tomei. Tem uns cinco anos e até hoje não tive nada, não”, assegura o navegador.
O casamento com a segunda mulher terminou assim que a aventura pelos rios começou, mas as águas lhe trouxeram também amores, como Fabiana, uma professora de Ipoeiras, no Tocantins. O romance é uma das passagens contadas no livro Além dos rios, biografia de Aladir Murta lançada em 2009. Por causa dessa aventura, ele se tornou ambientalista e, a cada cidade, dá palestras sobre o meio ambiente. Em cada município, também recolhe certificados comprovando que passou navegando pelos lugares. “Agora quero entrar com os papéis para conseguir o título de maior navegador solitário pelo Guiness”, diz.
E, segundo ele, a solidão é relativa. “Quando estou no rio converso com as plantas, com os animais. A minha navegação é solitária para essa sociedade que vive em um mundo cão, contaminado pelo vírus da destruição. Tem gente que me acha louco, pena que não são loucos como eu, porque seriam felizes como sou”, diz. Depois de 13 anos, Aladir confessa que os braços estão começando a dar sinais de cansaço, mas nem por isso ele vai abandonar a navegação. “Quando entro num rio, é como se eu fosse uma criança, e quando chego ao mar, é como se tivesse alcançando o céu.”
Nascido num encontro de rios em Itira, distrito de Araçuaí, e criado em Coronel Murta, cidades do Vale do Jequitinhonha, Aladir acaba de voltar às origens e concluir a travessia “mais difícil e bonita que existe”. Em três meses, remou em sua canoa – agora de fibra de vidro – por mais de 1 mil quilômetros no Rio Jequitinhonha, de Medanha, distrito de Diamantina, até a foz, em Belmonte, na Bahia. Emocionado depois do reencontro com o curso d’água de sua infância, Aladir veio a Santa Luzia, na região metropolitana, visitar a mãe, de 104 anos, e conversou com o Estado de Minas sobre as aventuras a bordo. A próxima investida será percorrer novamente o Velho Chico, da Serra da Canastra à foz.
Antes de ser navegador, Aladir foi cabo do Exército e lapidário de pedras preciosas, trabalhou também numa pequena indústria e cruzou o país numa moto. Mas importante para ele foi a história que começou a escrever em 14 de setembro de 2000. “Lia muito sobre o Rio Araguaia e tinha muita vontade de conhecê-lo. Lá, descobri que se navegasse um quilômetro, navegaria dois até chegar a 60 mil”, conta o navegador, que se tornou presidente da Associação de Proteção do Rio Araguaia e da Ilha do Bananal.
Desde o início da aventura, Aladir não tem residência fixa e o celular vive fora de área. “Quem quiser me encontrar, é só ir a um rio”, diz. Na embarcação guarda tudo que precisa: barraca, colchão inflável, rede, duas panelas, duas varas de pescar, um fogareiro, um facão e alguns mantimentos em garrafas PET. Num outro compartimento, duas calças, duas bermudas e duas blusas. Os documentos vão num tambor, para não correr o risco de molhar – o suficiente para sobreviver entre as margens dos rios, onde histórias fantásticas e lendas se fundem.
Homem de fala lenta e palavras simples, Aladir parece até conversar num outro idioma quando começa a contar dos trajetos dos rios e nomes de tribos. No Araguaia, passou dias atracado, cuidando de uma onça ferida. Num outro episódio, próximo a Aripuanã, em Mato Grosso, ele viu um ritual de canibalismo. Também já se deparou com jacaré de sete metros na Amazônia e tomou uma capivara da boca de uma sucuri. “É nesse lugar que tem a cobra grande, de mais 20 metros”, conta. Mas essa seu Aladir não viu. “Só que eu vi quem viu a cobra”, diz o navegador, mostrando sabedoria.
PELAS ÁGUAS A remo, cruzou fronteiras com Peru, Colômbia e Paraguai, superou quedas d’água de 10 metros de altura, navegou o São Francisco e o Velhas três vezes cada um e, nessas viagens, passou por alguns apuros. Já naufragou, enfrentou tempestades, comeu peixe cru por uma semana, foi assaltado cinco vezes e, sem outra opção, teve que beber água do poluído Rio das Velhas. “Foi lá em Santana do Pirapama. Passei a mão como se estivesse limpando e tomei. Tem uns cinco anos e até hoje não tive nada, não”, assegura o navegador.
O casamento com a segunda mulher terminou assim que a aventura pelos rios começou, mas as águas lhe trouxeram também amores, como Fabiana, uma professora de Ipoeiras, no Tocantins. O romance é uma das passagens contadas no livro Além dos rios, biografia de Aladir Murta lançada em 2009. Por causa dessa aventura, ele se tornou ambientalista e, a cada cidade, dá palestras sobre o meio ambiente. Em cada município, também recolhe certificados comprovando que passou navegando pelos lugares. “Agora quero entrar com os papéis para conseguir o título de maior navegador solitário pelo Guiness”, diz.
E, segundo ele, a solidão é relativa. “Quando estou no rio converso com as plantas, com os animais. A minha navegação é solitária para essa sociedade que vive em um mundo cão, contaminado pelo vírus da destruição. Tem gente que me acha louco, pena que não são loucos como eu, porque seriam felizes como sou”, diz. Depois de 13 anos, Aladir confessa que os braços estão começando a dar sinais de cansaço, mas nem por isso ele vai abandonar a navegação. “Quando entro num rio, é como se eu fosse uma criança, e quando chego ao mar, é como se tivesse alcançando o céu.”
SONHO
Ainda criança, sempre tive o desejo de ser grande como o mar e também ser simples como ele, que tem a humildade de ficar abaixo de todos os rios do mundo
SEM RUMO
Deixo acontecer. Vou visitar um rio e, quando assusto, já estou chegando ao outro. Não uso mapas nem nada, vou perguntando para os ribeirinhos. Brinco com a fúria da natureza, mas sempre respeitando os limites do rio
DEGRADAÇÃO
Nossos rios estão com uma vela na mão, todos poluídos. As autoridades estão demorando a agir. Elas têm que largar o papel e a mesa e começar a agir na prática
JEQUITINHONHA
É rio com paisagens mais bonitas. Mas, em vários pontos, a água é barro, o leito está todo assoreado e a vegetação destruída. Vi dragas maiores do que uma casa
IRREGULARIDADES
Acho que depois de navegar tanto, tenho o direito de cobrar mais da área da fiscalização. Ela é fraca e arbitrária. O governo beneficia quem não tem um anzol na mão. O que vemos aí é mulher de vereador recebendo bolsa de auxílio ao pescador
PEDIDO
Se um dia, por acaso, me encontrarem morto junto das águas, peço que não me tirem de lá, mas me enterrem na beira de um rio
Nenhum comentário:
Postar um comentário