A igreja, fiel a sua concepção teológica, não pode aceitar o sexo --que é pecado-- como mero prazer
A verdade é que, quando em 25 de julho de 1978, Louise Joy Brown tornou-se, ao nascer, o primeiro bebê de proveta, foi como se alguma coisa sagrada ruísse, provocando a indignação de quem acredita na origem transcendental do homem.
De fato, a manipulação do óvulo feminino e do espermatozoide masculino para fazer nascer uma pessoa punha em questão o mistério sagrado que envolvia nossa origem. Não por acaso, a indignação maior, em face disso, foi da Igreja Católica.
Trata-se de assunto delicado porque envolve aquilo que é, no meu entender, o princípio básico da teologia cristã: o pecado original.
Ele é o fator determinante da posição da igreja com respeito a uma série de questões fundamentais. Tão importante é o conceito de pecado original que, conforme a versão cristã, o Cristo foi concebido sem pecado, ou seja, Maria não foi fecundada sexualmente por José, seu marido, mas pelo divino Espírito Santo.
Por isso mesmo, ostenta a denominação de Virgem Maria. Todos os demais seres humanos, concebidos na relação sexual, nascem pecadores, segundo essa doutrina, e, para os livrarem disso, a igreja criou o rito purificador do batismo.
Por que a igreja encara o ato sexual como pecado é difícil de explicar, uma vez que se trata de uma necessidade natural e vital, pois dele depende a sobrevivência da espécie.
Por isso mesmo, a igreja teve que, sem negar-lhe o caráter pecaminoso, encontrar meios de admiti-lo. Esses meios são o casamento religioso e o batismo. Este é tão fundamental que, se o bebê morre antes de ser batizado, vai para o inferno.
Se essa é a visão da igreja, deveria então aprovar a fecundação in vitro, já que, neste caso, o ato sexual é dispensado e, consequentemente, o bebê que dali nasce não traz consigo o pecado original.
Espero que não se veja, nesta minha observação, qualquer propósito sacrílego, mas apenas uma dedução lógica: o bebê de proveta foi concebido sem pecado. Como Cristo? Não, como o Cristo não, já que este nasceu por intervenção do Espírito Santo, enquanto o bebê de proveta deve sua existência à intervenção de um mero biólogo.
Sem pretender dar uma de teólogo, arrisco afirmar que o conceito de pecado original é a base mesma da doutrina cristã, de modo que a ele se deve o entendimento da relação sexual como um ato só admissível quando praticado visando a procriação. Como puro e simples prazer é inaceitável. A partir desse entendimento, torna-se lógico que a igreja se oponha à relação entre indivíduos do mesmo sexo, que não vise a procriação e, sim, unicamente o prazer sexual.
Pela mesma razão, a igreja também condena o uso da camisinha, cuja função é evitar a fecundação e, por conseguinte, a procriação. Não se trata, portanto, de mero preconceito ou conservadorismo de fundo moral. Pelo contrário, a igreja, fiel a sua concepção teológica, não pode aceitar o sexo --que é pecado-- como mero prazer.
No passado, quando a fé católica dominava de modo incontestável a sociedade, houve casos de mulheres casadas que, mesmo transando com o propósito de procriar, achavam-se tão culpadas que, para não sentir prazer algum, martirizavam-se durante o coito, certas de que, desse modo, livrar-se-iam de ir para no inferno, após a morte.
Eu que sou a favor do casamento de pessoas do mesmo sexo e considero o prazer sexual uma das boas coisas da vida, entendo que os católicos --e particularmente as autoridades eclesiásticas-- se oponham ao sexo como mero prazer. É uma questão doutrinária.
Observo, porém, que essa atitude é mais fácil de defender em teoria do que na prática, como o demonstram os numerosos casos de padres pedófilos denunciados recentemente.
Mas esse é um problema que cabe ao papa Francisco resolver. De minha parte, louvo a conquista científica que fez nascer 4 milhões de pessoas e levou alegria a milhões de casais sem filhos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário