domingo, 24 de fevereiro de 2013

George Orwell volta à BBC, agora em bronze - Bernardo Mello Franco

folha de são paulo

DIÁRIO DE LONDRES
o mapa da cultura
Censura à estátua
George Orwell volta à BBC, agora em bronze
BERNARDO MELLO FRANCONão, não é o Bial. O pai do verdadeiro Big Brother, George Orwell (1903-1950), também trocou o jornalismo por outro ramo. Mas manteve distância segura de gente vocacionada para brilhar em reality shows.
Orwell preferiu a literatura às redações. No clássico "1984", descreveu um regime totalitário em que o Grande Irmão investia em câmeras para espionar a vida de cada cidadão. As cenas de tortura do livro se passam numa certa Sala 101, referência ao local das reuniões longas e improdutivas que aborreciam o autor quando ele ainda assinava seu nome real, Eric Blair, e batia ponto na BBC.
Há poucos dias, o conselho de Westminster, que administra parte do centro de Londres, autorizou a instalação de uma estátua do escritor em frente à Broadcasting House, a sede reformada da rede britânica. Nada anormal, se o anúncio não incluísse a informação de que a homenagem deveria ter saído antes, mas foi censurada pela emissora.
O responsável pelo veto foi Mark Thompson, diretor-geral da BBC até o ano passado. Segundo revelou uma das idealizadoras da estátua, ele achou que o ex-funcionário ilustre não merecia a deferência por ter sido "muito esquerdista". O executivo, que agora manda no "New York Times", confirmou a história.
Não deixa de ser irônico que o "esquerdismo" tenha sido usado para punir um escritor que teve uma de suas obras transformada em peça de campanha contra o comunismo. Socialista democrático, Orwell despejou suas críticas à URSS em "A Revolução dos Bichos", fábula sobre os desmandos de Stálin. Morreu em 1950, quando ainda pegava mal na esquerda criticar o Guia Genial dos Povos.
A estátua custará 110 mil libras (cerca de R$ 330 mil) e será bancada por doações de gente como o dramaturgo Tom Stoppard e o humorista Rowan Atkinson, o Mr. Bean.
Enquanto o Orwell de bronze não é inaugurado, os fãs do escritor podem se deleitar com um site da BBC sobre a sua passagem pela rede. A página reúne material de primeira, como o fac-símile da sua carta de demissão, datilografada em setembro de 1943. Está tudo em bbc.co.uk/archive/orwell.
EU POLACO, TU POLACAS
"Dzien dobry" não é "good morning", mas a chance de ouvir as duas palavras como cumprimento é cada vez maior por aqui. Na dúvida, improvise um sorriso: você acabou de receber um bom-dia em polonês.
O idioma acaba de se tornar o mais falado na Inglaterra depois do inglês, segundo o Censo 2011, divulgado no final do mês passado. Deixou para trás o panjabi e o urdu, que lembram o colonialismo britânico na Ásia e ainda reinam absolutos nos mercadinhos 24 horas.
A imigração polonesa viveu seu auge em 2004, quando o Reino Unido abriu as portas a novos integrantes da União Europeia. Com a crise econômica, muita gente voltou para casa nos últimos anos, e agora o país do Leste Europeu vive uma invasão cultural ao contrário. Os linguistas de lá batizaram o fenômeno de "ponglish", uma mistura de polonês e inglês que já criou palavras engraçadas como "tiszert" ("t-shirt", ou camiseta).
BOLAS DA VEZ
O censo também investigou as línguas menos faladas na terra da rainha. Ganhou outro resquício colonial: o crioulo caribenho, com apenas dois falantes. Mais fácil ouvir o inglês jamaicano, cultivado por cantores que imitam Bob Marley no metrô.
Quem estiver atrás de investimento seguro deve apostar em escolas de inglês para falantes de romeno e búlgaro. São as línguas dos novos migrantes, que poderão fincar bandeira na ilha.
FILA PARA SE MOLHAR
Numa cidade onde chove o tempo todo, parece estranho que legiões de moradores e turistas enfrentem até três horas de fila num museu para... pegar chuva. Mas esta é a receita do sucesso da "Rain Room", instalação do grupo de arte contemporânea Random International que tem lotado o Barbican Centre desde outubro.
O programa é entrar numa sala escura, em grupos de cinco por vez, e caminhar numa simulação de chuva torrencial. Um conjunto de sensores controla os jatos d'água para não encharcar os visitantes, contanto que eles não estejam de preto e evitem movimentos bruscos.
Ninguém sai inteiramente seco, mas a reação geral é positiva. "Mesmo sabendo como funciona, parece mágica", diz a carioca Elisa Cristophe, que esteve lá em dezembro e se orgulha de ter esperado apenas uma hora e meia para entrar.
A mostra termina no próximo domingo. Como a vida anda corrida, este diarista vai se contentar com a chuva do lado de fora.

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