domingo, 17 de março de 2013

CRISE NA SAúDE » Calvário no atendimento - Marinella Castro e Carolina Lenoir‏

Paciente de convênios sofre com prontos-socorros lotados e longa espera, que chega a cinco horas, ao buscar serviço. Tempo é semelhante ao da rede pública 


Marinella Castro e Carolina Lenoir

Estado de Minas: 17/03/2013 


Na tarde de terça-feira, os meninos Guilherme Mariano, de 13 anos, e Vitor Hugo, de 11, usuários de planos de saúde, precisaram ir a uma unidade de pronto atendimento. Guilherme foi levado pelos pais à rede privada. Vitor Hugo, ao sistema público. Na manhã daquele dia, em um mau jeito com a bola, Guilherme quebrou o braço em um jogo de basquete na escola. Vitor Hugo, que tem uma enfermidade renal, estava com inchaços no corpo. No hospital privado, credenciado no plano de saúde e também na unidade ligada ao Sistema Único de Saúde (SUS), os meninos ganharam uma senha, esperaram e depois receberam uma pulseira verde, protocolo nas emergências que indica que o caso do usuário é pouco urgente.
 Cláudia, publicitária, e Helder Mariano, administrador de empresas, passaram a tarde com o filho na unidade privada. Às 14h45 eles garantiram a senha para entrar na fila do atendimento. O cenário era desanimador: a sala de espera estava lotada. Três horas depois, Guilherme ainda esperava. Outros 40 minutos se seguiram, até a família ser chamada pelo ortopedista. O menino saiu da unidade com o braço engessado, às 18h30. No atendimento do Sistema Único de Saúde (SUS), a mãe de Vitor, Cecília Danielle Loureiro, operadora de telemarketing, recebeu a senha às 15h30. O garoto só conseguiu passar pela triagem às 17h40. Às 19h30, Cecília seguia para casa com o diagnóstico: o incômodo do garoto tratava-se de uma alergia. O tempo para o atendimento de Guilherme Mariano somou três horas e meia, o de Vitor Hugo, quatro horas.
Entre 11 e 15 deste mês, a reportagem do Estado de Minas percorreu 12 hospitais de Belo Horizonte que atendem clientes de convênios e também unidades ligadas ao SUS. Nas urgências, usuários de planos chegavam a ser informados, logo na entrada, de que se optassem por ficar teriam de aguardar cinco horas para ser atendidos. Muitos desistiam para voltar no dia seguinte, o que às vezes não era suficiente ainda para resolver a questão, em uma peregrinação. Na rede pública, em alguns hospitais, o prazo de cinco horas de espera era superado. As queixas dos usuários da rede pública e privada são parecidas. Tempo de espera longo demais e unidades superlotadas.
Com o surto de dengue e a chegada do outono, quando as doenças respiratórios chegam a fazer a demanda dos prontos atendimentos crescer em até 30%, a perspectiva é tensa para os usuários da saúde. Em aviso recente, o Hospital Vila da Serra comunicou que a partir desta quarta-feira fecha as portas para a urgência pediátrica, fazendo crescer uma tensão já enorme de estrangulamento no atendimento infantil. O hospital encerra também seu pronto-socorro geral, em funcionamento há 14 anos. Em nota, o Vila da Serra explicou que o pronto atendimento era subsidiado, mas a situação se tornou insustentável porque os planos de saúde não reajustaram as taxas hospitalares.

Expansão dos planos
mostra fratura na rede


O crescimento dos planos de saúde em todo o país, maior que a evolução da rede de prestadores, expõe uma fratura da saúde privada. Estimativas do setor dão conta de que na última década a demanda nos hospitais privados em Belo Horizonte avançou em ritmo de crescimento para lá de chinês, 70%. As urgências e emergências estão sobrecarregadas, trabalhando em sua capacidade máxima, e não há como atender rapidamente o usuário, uma vez que existe um forte descompasso entre oferta e demanda.
Na Grande BH, o número de consumidores que assinaram contrato com os planos foi ampliado em 61%. Em Belo Horizonte, em 10 anos, 340 mil novos usuários aderiram aos planos. Enquanto no país 75% da população usa a saúde pública, na capital mineira, 54% são atendidos pelos planos. A rede de prestadores no entanto não conseguiu acompanhar a velocidade da expansão da carteira de clientes.
 Depois de aguardar pouco mais de uma hora para ser chamada a fazer a ficha médica de seu filho, no Hospital Felício Rocho, Cláudia Mariano diz que não contava ficar tanto tempo no hospital. “Quando conseguimos passar pelo funil, o atendimento médico foi bom. Em 15 minutos de consulta tivemos o diagnóstico. A equipe precisa ser reforçada, de médicos e atendentes”, opinou. O Felício Rocho informou que trabalha com capacidade máxima e que a equipe de médicos cresceu 33% para atender a demanda, aumentada em 20% pela dengue.
Cecília, mãe de Vitor Hugo, contou que tem um plano de saúde, mas, como tem dificuldade em encontrar um nefrologista entre os médicos conveniados, ela acaba recorrendo ao SUS, como fez na última semana ao levar o filho ao Hospital Municipal Odilon Behrens (HMOB). “De qualquer forma, quando preciso ir pelo plano de saúde, espero em média de três a quatros horas”, comenta. Paula Martins, membro do Comitê Gestor de Gerência de Urgência do SUS, ligado à Prefeitura de Belo Horizonte, diz que 50% do atendimento nas unidades não é de fato grave e deveria ser resolvido nos consutórios. Ela considera que a rede está adequada à demanda.

Paciência Como Vitor Hugo e Guilherme, o tempo de espera de Ramon Costa, supervisor comercial que acompanhou a mulher no pronto atendimento da Unimed-BH, foi de quatro horas e meia. No Hospital João Paulo II, a servente de pedreiro Priscila Oliveira esperou quatro horas e 20 minutos com o filho Hiago Júnior, diagnosticado com bronquite. No Hospital São Camilo, Elisângela Nogueira, cabeleireira, foi duas vezes. À noite, o tempo de espera era de cinco horas. Seu filho João Pedro, de 1 ano, foi atendido no dia seguinte. No Lifecenter, Samara Brandão, esperou três horas acompanhando o namorado, David da Silva, de 26 anos.
A Unimed-BH informou que o tempo médio de espera em suas unidades está de acordo com o que o Protocolo de Manchester preconiza. “A grave epidemia de dengue na Região Metropolitana de Belo Horizonte reflete-se nos serviços de saúde públicos e privados”, justificou a cooperativa, alegando que essa demanda “tende a impactar o tempo de espera no pronto atendimento”. No Lifecenter, o diretor clínico informou que, por mês, o hospital atende no pronto-socorro 3 mil pacientes a mais que sua capacidade, de 10 mil pessoas. Já o São Camilo explicou que nessa época do ano há uma sazonalidade, com picos de atendimento. (colaborou Marta Vieira). 

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